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- Primavera Árabe e suas flores para o Cinema
Fonte: G1 Fonte: Blog Tela Botequim #PraCegoVer [FOTOGRAFIA]: Duas imagens separadas por uma linha branca. A primeira mostra a personagem Farah (Baya Medhaffer), do filme Assim que Abro Meus Olhos (2015), em um palco olhando para o lado com um sorriso. A segunda é uma cena do filme Clash (2016), mostrando vários homens dentro de um camburão. A onda revolucionária produzida pela Primavera Árabe gerou repercussões em diversos aspectos da vida social na região, inclusive na produção cinematográfica. Iniciada em dezembro de 2010 na Tunísia, os primeiros protestos tiveram por estopim a autoimolação de Mohamed Bouazizi, em forma de manifestação contra a corrupção policial e os abusos políticos cometidos pelo regime do presidente Zine El Abidine Ben Ali – o que levou à sua renúncia após 23 anos no poder. Da Tunísia, a insurreição se espalhou por quase toda a região, levando à renúncia ou troca de vários chefes de Estado, dentre eles o presidente Hosni Mubarak do Egito e o presidente Muammar al-Gaddafi da Líbia. Uma vertente do cinema árabe, a partir de então, traçou um caminho cujo mote tem sido o enfrentamento dos novos desafios do mundo árabe, direcionado principalmente à ampliação da liberdade de expressão. É assim que, através da insurreição social e política, o mundo árabe apresenta atualmente uma vasta gama de filmes que busca demonstrar as questões que afligem as novas gerações. Exemplo disso é o longa-metragem tunisiano Assim que Abro Meus Olhos (2015), da jovem cineasta Leyla Bouzid, construído ao redor da trajetória de Farah (Baya Medhaffer), estudante que personifica os anseios e inconformismos da geração que logo estaria na linha de frente da Primavera Árabe. Cantora de uma banda de rock, Farah vivencia um novo mundo ao chegar à adolescência, desfrutando das festas à noite, e contrariando os cânones ditados por sua mãe, Hayet (Ghalia Benali), que pretende ver sua filha médica. Ambientado nas vésperas da revolução que derrubou o presidente Ben Ali logo, o filme logo mostra como a protagonista e seus amigos descobrem a repressão policial, que pretende calar as vozes dissidentes até mesmo de rebeldes sem militância política. O furor da repressão vivenciada por Farah é poeticamente exaltada ao cantar nas apresentações de sua banda de rock. Já Clash (2016), dirigido pelo jovem diretor egípcio Mohamed Diab, se passa ao longo de um dia de protestos no Cairo em virtude do golpe militar que derrubou o presidente Mohamed Morsi, sucessor de Hosni Mubarak, que caíra dois anos antes. O filme é ambientado em um camburão policial que começa vazio e vai se enchendo de pessoas ao longo do enredo. A diversidade das pessoas e dos propósitos que vão se acumulando no camburão trazem o tom do questionamento político. Dentre os presos estão pessoas das mais variadas idades e posições políticas, chegando a certas condições absurdas desde o aprisionamento de pessoas apoiadoras do governo que são confundidas, até uma criança. A confusão que se inicia dentro do veículo é um reflexo da diversidade de opiniões que se pretende demonstrar. Os filmes, eminentemente políticos, são manifestações das flores deixadas pela Primavera Árabe. A nova tonalidade do cinema árabe permite que as cores desse movimento histórico sejam impressas nos olhares dos espectadores com as experiências daqueles que lutaram por suas visões de mundo em condições adversas. Cassiano Ribas Graduando em Ciências Sociais (FFLCH-USP) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2019/2020. #PrimaveraÁrabe #Cinema #Revolução #MundoÁrabe #Tendências
- A abordagem científica vs religiosa no contexto de Darwin
As dualidades entre Ciência e Religião presentes em diferentes esferas do filme "A Criação", de Jon Amiel Fonte: Blog "Coruja Bióloga" #PraCegoVer [Fotografia]: A imagem é inteiramente preenchida pelas figuras de um homem (que está do lado direito), e um macaco (que está do lado esquerdo), ambos sentados no chão. Eles estão apontando um em direção ao outro de forma que os seus dedos indicadores se tocam um pouco mais a esquerda do centro da imagem. O fundo é composto por grades. O conflito entre ciência e religião, que recentemente vem assumindo grande projeção na mídia devido a falas e medidas tomadas pelo atual presidente da República Jair Bolsonaro (sem partido), perpassa questões relativas a nossa sociedade há séculos. Tomemos como exemplo o filme A Criação (2009), de Jon Amiel, em que aborda os precedentes da publicação do "A Origem das Espécies" (1859) de Charles Darwin. O filme foi baseado no livro "Annie’s Box: Charles Darwin, his Daughter and Human Evolution” (A caixa de Annie – Charles Darwin, sua filha e a evolução humana, 2002), escrito por Randal Keynes, tataraneto de Darwin. Logo nos dois primeiros minutos de filme, a arte que antecede a primeira cena do naturalista com a filha, já sugere essa dualidade que vai costurar a narrativa inteira, percorrendo até as esferas mais íntimas e morais dos personagens. Consiste em imagens de animação que demonstram todo o processo de formação de um ser humano, desde a fecundação. E podemos observar que ao final desta cena, a imagem do formato do braço do bebê remete a posição das mãos no quadro “A criação de Adão” de Michelangelo. A dualidade permeia o filme não só em construções estéticas, narrativas e sócio históricas, mas também na biografia do próprio Darwin, que apesar dos seus questionamentos em relação a religião e a existência de um Deus, ainda viveu e foi enterrado dentro de rituais cristãos. Dualidade esta que também é presente na sua própria relação conjugal, já que tinha uma esposa religiosamente "fervorosa”, e que a mesma acaba por decidir pela publicação do livro ao final do filme. Essas questões externas somadas ao falecimento da filha fazem com que Darwin (Paul Bettany) enfrente questões internas muito fortes relacionadas a sua moral. Que está presente durante a narrativa inteira através de visões que o naturalista tem da própria filha morta. No entanto, essas visões que ocorrem no filme estão longe de assumir um caráter de leitura no campo religioso, e sim de uma manifestação de seus pensamentos reprimidos por não poderem atuar livremente. O naturalista Parslow (Jim Carter) que o atende o adverte nesse sentido. O filme também coloca em questão as transformações sociais e políticas que a teoria de Darwin teria, pois faria um questionamento direto à tese do criacionismo e logo, ao poder das igrejas. Nota-se também esse tipo de interesse em seu diálogo com dois de seus amigos no começo do filme, ao que é dita a frase “você matou Deus” com um certo entusiasmo por um de seus colegas. Como vemos, a dualidade entre ciência e religião perpassa o filme em diferentes planos: o estético, o pessoal, o histórico, o social, o das relações e o psicológico (da moral também). É importante ver como esse tipo de relação e a leitura sobre ela afeta em aspectos da nossa sociedade, tais como os valores e as suas relações de poder. O filme faz um recorte histórico de quando essas questões estavam sendo colocadas à prova e as relações que elas estabeleceram entre si, já que em determinado momento o próprio amigo de Darwin disse que àquela altura ele já tinha inimigos em metade da Europa. Trazendo para um cenário mais próximo, tomemos o exemplo os posicionamentos do atual Presidente da República Jair Bolsonaro (sem partido) em relação ao COVID-19. Chamando de “gripezinha”, indicando o uso do medicamento Hidroxicloroquina sem comprovação científica, transferindo a responsabilidade dos números de óbitos para os governadores e prefeitos, e por fim deixando de informar o total de mortes e casos pela doença, ainda se reunindo com representantes de TVs católicas para discutir alianças. Assim como vimos no filme, essas questões referentes a crença podem ser diretamente ligadas a estrutura da sociedade e contribuem para um mecanismo de controle social, podendo ser apropriadas para defender discursos e medidas por parte de quem está no poder. Nathalia Barreto da Silva Graduanda em Letras (FFLCH-USP) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo (2019/2020). #ciência #crença #cienciavscrença #darwinismo #religiosidade
- Camus e conflitos em tempos de pandemia
#PraCegoVer [PINTURA]: Em tons quentes, a imagem retrata várias pessoas com semblantes tristonhos. Algumas, no canto superior direito e no centro da imagem, cavando buracos para eventuais covas, e outras, a esquerda, no canto inferior direito e no centro, carregando caixões com mortos vítimas da peste bubônica na Idade Média, durante o final da primeira metade do século XIV. As diferentes sociedades estão se articulando para se remodelar em um novo cenário, até então desconhecido, que se instaurou a nível global em nosso cotidiano. A pandemia do coronavírus – nova cepa viral descoberta em 2019 e intitulada COVID-19 – veio para balançar estruturas que já não estavam tão estáveis e reforçar, ainda mais, o cenário político polarizado que o Brasil vem enfrentando nos últimos anos. Neste contexto, as opiniões sobre a doença vêm se dividindo severamente, contribuindo para que as possíveis soluções de combate ao vírus ganhem ou percam credibilidade na mesma proporção. Toda essa discordância acaba tornando os esforços de controle de disseminação mais complicado para os agentes da saúde e autoridades públicas – estes que também divergem entre si. O filme A Peste (Luis Puenzo, 1992), baseado no romance escrito pelo franco-argelino Albert Camus em 1947, dialoga exatamente com esse dualismo recorrente na atualidade. Em nosso contexto, considerando que os porta-vozes para conter o vírus são especialistas da ciência medicinal, que não têm medido esforços para conhecer mais sobre esse novo fenômeno, trabalhando e estudando incansavelmente, qualquer outra recomendação ou medidas contrárias às deles acabam sendo facilmente descartadas. Todavia, subsistem discursos de grupos que, em prol exclusivamente da economia, a fim de evitar a irrevogável crise econômica que o mundo irá enfrentar, procuram descredibilizar qualquer restrição que prejudique os negócios no país, a exemplo do necessário período de isolamento, recomendado pela OMS (Organização Mundial da Saúde). A obra de Camus retrata bem os dias de aflição e divergência que o planeta tem vivido nos últimos meses. A história é narrada em Oran, cidade francesa na costa argelina, que entra em colapso com a chegada de uma epidemia causada por uma infestação de ratos, e é submetida ao famigerado isolamento e aos conflitos existenciais ocasionados por este. Diante da situação de calamidade pública e caos social, as pessoas começam a pensar e questionar o mal inevitável, reagindo de diferentes formas às circunstâncias em que estão submetidas, e como viver/sobreviver com essa realidade. Todas as supostas verdades e mentiras, crenças e descrenças começam a ser ressignificadas durante o enredo, apresentando os diferentes pontos de vista e apontando os comportamentos coletivistas e individualistas das personagens. Não muito diferente, a realidade atual é marcada pelos mesmos questionamentos e por negacionismos. O filme aponta o mal-estar contínuo de autoridades públicas, contrárias ao comportamento incontestável do Dr. Rieux (William Hurt), personagem principal da obra, que busca se manter racional durante esse período conturbado, focando estabelecer medidas que controle a doença, sem ultrapassar os limites éticos de sociabilidade. Semelhantemente, em nossos dias, há um determinado grupo colocando em dúvida as metodologias e descobertas cientificas da medicina, que corroboram para o bem da saúde coletiva, apoiando-se em crenças individuais e sem embasamento teórico e prático, que tenha um mínimo de fundamento e concisão no que tange a saúde da população para o enfrentamento do coronavírus. De um lado, decisões que colaboram para o restabelecimento das atividades coletivas, de maneira altruísta e assumindo uma responsabilidade perante a sociedade, e, de outro, resistências que se concentram em interesses puramente políticos e econômicos, visando a alcançar uma estabilidade inexistente e sem condições de ser estabelecida normalmente, como se centenas de milhares de pessoas não estivessem sendo afetadas de diversas maneiras mundo afora. Dessa forma, trazendo reflexões consideráveis para se pensar o momento sombrio que o mundo vem enfrentando. Larissa Dias dos Santos Graduanda em História (FFLCH/USP) e voluntária no Projeto CineGRI Ciclo 2019-2020. Fontes: [1] Lent, Roberto. Entre a ciência e a crença existe uma grande diferença. O Globo, 2019. Disponível em: < https://oglobo.globo.com/sociedade/artigo-entre-ciencia-a-crenca-existe-uma-grande-diferenca-23941757>. Acesso em: 18 de maio de 2020. [2] Oliveira, Bernardo. A Peste de Camus e a solidariedade na epidemia. Pensar a Educação, 2020. Disponível em: < https://pensaraeducacao.com.br/pensaraeducacaoempauta/a-peste-de-camus-e-a-solidariedade-na-epidemia/>. Acesso em: 18 de maio de 2020. [3] Picón, David Ontoso. The Plague (1992). From Albert Camus to Luis Puenzo. Journal of Medicine and Movies, 2005. Disponível em: . Acesso em: 18 de maio de 2020. #Pandemia #Polaridade #Ciência #Crença #Divergência
- Crenças, fé e conhecimento
Fonte: Netflix Brasil #PraCegoVer [ILUSTRAÇÃO]: Na imagem encontra-se o mapa mundi, com milhares de pontos vermelhos espalhados por todos o globo, representando uma pandemia viral, no centro da imagem podemos encontrar um símbolo em preto da própria série. No presente ano de 2020, estamos passando por uma pandemia, o novo Coronavírus (Covid-19). Surge, novamente, um conflito entre ciências e crenças, assim como foi no século XIV com a Peste Negra, a pandemia mais devastadora já registrada na história humana, e, também, como ocorreu há 100 anos atrás com a Gripe Espanhola, que matou mais que o total das duas guerras mundiais. Em meio a esses cenários de surtos virais que já ocorreram várias vezes ao longo de nossa história, em quem devemos acreditar? Para onde devemos recorrer? O que devemos esperar? Na idade média, a linha entre religião e ciência era tênue, a peste negra foi interpretada por muitos cristãos como punição divina pelos pecados da humanidade, e por consequência dessa submissão a medicina foi muito pouco desenvolvida. Já em 1918, as incertezas e o medo da morte, fizeram com que a população novamente se voltasse para a explicação divina sobre a origem da gripe espanhola. Porém, o conhecimento sobre a existência de micro-organismos patogênicos e do índice de transmissão, acarretou a democratização dos culpados e grandes avanços na medicina. Na atual pandemia, alguns fiéis de determinados segmentos religiosos continuam a se aglomerar, optando por colocarem suas vidas nas mãos de suas divindades, em vez de seguirem as orientações das autoridades públicas. Tal situação se assemelha ao que assistimos no quinto episódio da série Pandemia (2020): indivíduos, que por motivos religiosos, se recusam a se submeterem às vacinas. É o caso de uma jovem mulher do Oregon, mãe de três filhos. Pela lei, ninguém pode obrigá-la, mas, em compensação, as crianças ficam impedidas de se matricular na escola, pois representam risco de contágio para as outras. Neste mesmo episódio, é analisado também como a comunidade, a família e a fé ajudam os médicos a permanecerem fortes durante um período de pânico. As pandemias são cíclicas e parece que cada século enfrentamos uma; e a união dos fatores citados acima encontrados na série, nos da oportunidade de enxergarmos grandes valores, como a sensibilidade e a solidariedade diante do sofrimento, a natureza como nossa “casa comum” e a importância do isolamento. Ademais, esse apoio dos fiéis oferecido aos médicos é conciliado com a necessidade, a ciência não tem uma agenda contra a religião. Ela se propõe simplesmente a interpretar a natureza, expandindo nosso conhecimento do mundo natural. Sua missão é aliviar o sofrimento humano, aumentando o conforto das pessoas, desenvolvendo técnicas de produção avançadas e ajudando no combate às doenças. A série Pandemia da Netflix reúne seis capítulos, que versam a procura de uma vacina universal para todo tipo de gripe, a vigilância epidemiológica em grandes concentrações humanas, como também nos animais e um constante comparativo entre pandemias virais anteriores, abordando personagens em várias partes do globo, Estados Unidos, México, Índia, China, Vietnã e Congo. Stephanie Gabriele Mendonça de França Graduanda em Engenharia de Produção (POLI-USP) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2019-2020. #Pandemia #Doenças #Surto #Religião #Ciência
- Scientia Vinces – lutar pela defesa do conhecimento
Fonte: miro.medium.com #PraCegoVer: [Fotografia]: Cartaz branco colado em parede de tom escuro. O cartaz tem a mensagem “ciência é progresso” escrita 21 vezes na vertical. “Você tem plantações de maconha, mas não são três pés de maconha, são plantações extensivas de algumas universidades, a ponto de ter borrifador de agrotóxico. Porque orgânico é bom contra a soja para não ter agroindústria no Brasil, mas na maconha deles eles querem toda tecnologia a disposição”. O tom da declaração feita pelo Ministro da Educação, Abraham Weintraub, em dezembro de 2019, evidencia a forma com que as universidades públicas e, consequentemente, a ciência vêm sendo tratadas no Brasil durante o governo Bolsonaro. Falsas acusações, cortes de verba e fortes ataques ameaçam a ciência no país e colaboram para a construção de uma narrativa fantasiosa que espalha desinformação e medo sobre a população brasileira. O filme E a Vida Continua (Roger Spottiswoode, 1993) trata do início da epidemia do vírus da AIDS nos Estados Unidos e revela os perigos da falta de suporte à ciência e a pesquisa num país. O roteiro gira em torno de um grupo de pesquisadores, liderado por Dr. Don Francis (Matthew Modine). A equipe procura combater a epidemia causada por um vírus desconhecido, com uma taxa de letalidade extremamente alta e que vinha sendo observado na comunidade gay em determinados locais do país. A história, baseada em fatos reais, se passa no início dos anos 1980, enquanto os Estados Unidos eram governados por Ronald Reagan, presidente pertencente ao partido Republicano e com perfil extremamente conservador. Nesse contexto, os movimentos LGBTQ eram absolutamente invisibilizados e uma doença, que até então era conhecida de maneira pejorativa como “câncer gay,” não era tratada como questão de saúde pública, uma vez que teoricamente atingia apenas uma minoria indesejada. Fato, este, que tornou a AIDS uma epidemia incontrolável, espalhando-se por todas as classes, gêneros e orientações sexuais dos americanos, vitimando milhares de pessoas. A trama se desenvolve com a luta dos pesquisadores para obter o financiamento de estudos sobre a doença, além do combate contra a desinformação, que acabou por contribuir ainda mais para a disseminação do vírus. O movimento gay americano, representado pela liderança de Bill Kraus (Ian McKellen), também possui grande protagonismo, sobretudo na luta por reconhecimento de sua identidade pelo Estado e sociedade, pela desconstrução do preconceito e pela busca de seus direitos. Ao fazermos um paralelo com a pandemia de Covid-19 que enfrentamos, é possível encontrar semelhanças entre ambas as situações. No caso específico do Brasil, o presidente Jair Bolsonaro transmitiu diversas declarações contra o isolamento social, recomendação da Organização Mundial da Saúde e tratada como única estratégia efetiva contra a disseminação do vírus. Seus argumentos colocam economia e saúde em polos opostos, valendo-se do medo e da ameaça do desemprego para atacar e desmoralizar a ciência. Quanto ao discurso de culpabilidade, há também uma afinidade. Assim como na situação da epidemia de AIDS, em que os homossexuais eram apontados como sendo os responsáveis pelo contágio, é possível observar uma tentativa de responsabilizar a população asiática pela pandemia, através de ataques sistemáticos às suas respectivas culturas e de seguidos episódios de xenofobia. O caminho para o fortalecimento da ciência passa por democratizar o acesso à informação. Estamos imersos em uma situação crítica, sendo fundamental a união das frentes progressistas do país se em um único sentido, com ações concretas que garantam o fazer científico no país e desconstrua a narrativa de ignorância intencional difundida pela extrema direita. Yan Carvalho Graduando em Ciências Sociais (FFLCH-USP) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2019-2010. Referências: DAMASCENO, Victória. Weintraub repete acusações contra universidades com base em reportagens. Exame, São Paulo, 11 dez. 2019. Disponível em: https://exame.abril.com.br/brasil/ministro-da-educacao-repete-que-ha-plantacoes-de-maconha-nas-universidades/. Acesso em: 26 abr. 2020. SOARES, Ingrid. Bolsonaro defende fim do isolamento: "Se agravar vem para o meu colo". Correio Braziliense, [S. l.], 17 abr. 2020. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/politica/2020/04/17/interna_politica,845629/bolsonaro-fim-do-isolamento-se-agravar-vem-para-o-meu-colo.shtml. Acesso em: 26 abr. 2020. LOVISI, Pedro. Xenofobia, uma outra doença que veio com o coronavírus. Estado de Minas Gerais, [S. l.], 27 abr. 2020. Disponível em: https://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2020/04/27/interna_gerais,1142295/xenofobia-uma-outra-doenca-que-veio-com-o-coronavirus.shtml. Acesso em: 27 abr. 2020. FILME: “E a Vida Continua” (Roger Spottiswoode, 1993) #CoronaVirus #Ciência #Xenofobia #Bolsonaro #Resistência
- O preço do amanhã encontra o preço da desigualdade
#PraCegoVer [Fotografia]: Close-up no braço de um homem branco com uma espécie de tatuagem tecnológica que marca quantos minutos de vida a pessoa ainda tem. Neste caso, a tatuagem está zerada, mostrando que a pessoa esgotou seus minutos de vida, estando morta. Na sociedade capitalista, tempo é dinheiro. E é nessa premissa que o filme de longa metragem O preço do amanhã (Andrew Niccol, 2011) se ampara em seus 109 minutos, onde, neste futuro distópico, a população cresce e se desenvolve até os vinte e cinco anos e, após completar seu vigésimo quinto aniversário, para de envelhecer. Entretanto, o preço pago por isso é alto. Não há mais dinheiro em cédulas como conhecemos e que em nosso mundo real está com seu tempo contado se considerarmos a popularização de criptomoedas e carteiras eletrônicas como Google Pay, PicPay e Mercado Pago. As pessoas são pagas e pagam pelos seus serviços debitando seu tempo de vida, da forma mais literal possível, com um relógio digital integrado no braço. Quem é rico tem mais tempo – podendo viver eternamente. Quem é pobre, bem, você sabe. Tem que estar sempre correndo atrás de sua sobrevivência. Sendo uma ótima alegoria para a sociedade de consumo exacerbado que o capitalismo nos aloca, o que a gente possui acaba nos possuindo, tornando parte de nosso ser. A oferta de novos produtos é tão alta que se reverte felicidade em ter coisas. O relógio exibido no filme que indica quantos minutos de vida restam para seu consumidor, nada mais é que a materialização daquilo que o capitalismo se sustenta: o dinheiro e o tempo de vida de cada pessoa acaba sendo, ao final, a mesma coisa. O Sistema das Nações Unidas (ONU) possui o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), local de discussão em relação a preservação ambiental e sustentabilidade liberou dados alarmantes acerca do esgotamento de recursos naturais e aumento da poluição atmosférica. Como visto nos dados liberados pela PNUMA, é revelado que nos últimos dez anos as emissões de gases de efeito estufa cresceram em média de 1,6% ao ano [1]. Além disso, com perdas de fertilidade ligadas à erosão e ao esgotamento de recursos naturais, cerca de 20% da superfície da Terra sofreu declínio de sua produtividade, como mostrado no site da ONU [2]. Assim o filme "O preço do amanhã", o protagonista Will Salas, interpretado por Justin Timberlake, é um jovem vindo da região pobre da cidade que, ao ganhar um século de vida de um ricaço que encontra na rua, torna-se uma espécie de símbolo da desigualdade social sustentada por este sistema, um Robin Hood que rouba dos ricos e distribui para os pobres. A obra cinematográfica apresenta o preço da desigualdade, realidade cruel e longe de ser ficção; de acordo com a ONU, 1% da população movimentou 82% de toda a riqueza criada em 2017 [3]. Ao final do longa, fica a reflexão: vendemos nosso tempo de vida para o consumo e este consumo afeta drasticamente o meio ambiente. Ainda há tempo de reverter isso? O sistema capitalista combina com a restauração de recursos naturais? Existe interesse do mercado em sustentabilidade? A ação tem que ser rápida. Nem causa mais surpresa que até 2050 haverá mais plástico que peixes.[4]. O preço do amanhã, infelizmente, já conhecemos. Marcela Sayuri Graduanda em Letras (FFLCH-USP) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2019-2020. Fontes: [1] ONU Meio Ambiente: foco político na crise climática é o maior em uma década . Nações Unidas Brasil, 2019. Disponível em: . Acesso em: 4 de fevereiro de 2020. [2] ONU Meio Ambiente: ONU declara Década sobre Restauração de Ecossistemas. Nações Unidas Brasil, 2019. Disponível em: . Acesso em: 4 de fevereiro de 2020. [3] UOL: Década vê explosão de milionários e desigualdade que ameaça democracias. UOL, 2019. Disponível em < https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2019/12/31/decada-ve-explosao-de-milionarios-e-desigualdade-que-ameaca-democracias.htm>. Acesso em: 4 de fevereiro de 2020. [4] Buzzfeed: 15 fatos sobre o futuro do planeta que farão você odiar (ainda mais) a humanidade. Buzzfeed, 2018. Disponível em: . Acesso em: 4 de fevereiro de 2020. #desigualdadesocial #sociedadedoconsumo #escassezderecursosnaturais #opreçodoamanhã #capitalismo
- Uma vida fora de controle
Fonte: Site "Geonalta" #PraCegoVer [ILUSTRAÇÃO]: Verbete de dicionário. Em um fundo preto, destaca-se no centro, em letras vermelhas, a palavra Koyaanisqatsi. Abaixo, em letras menores, brancas e também centralizadas, lemos: ko.yaa.nis.qatsi (from the Hopi language), n.1. crazy life. 2. Life in turmoil. 3. Life out of balance. 4. Life disintegrating. 5. A state of life that calls for another way of living. Em livre tradução, temos: ko.yaa.nis.qatsi (da língua Hopi), n.1. vida louca. 2. vida em tumulto. 3. vida fora de equilíbrio. 4. vida se desintegrando. 5. um estado de vida que exige outro modo de viver. “Um estado de vida que exige outro modo de viver”. O que esperar de um filme com essa mensagem? Em poucas palavras, é possível dizer que Koyaanisqatsi, filme lançado em 1982, retrata nossa existência no mundo contemporâneo colocando em questão o que fazemos com nosso tempo, com nosso dinheiro e com os ambientes que nos cercam. Esses são os elementos fundamentais trazidos por Godfrey Reggio no filme, cuja narrativa é construída com o que há de mais poderoso na linguagem do Cinema: a união de imagens e sons em ritmos e enquadramentos diversos. Juntos, esses elementos vão despertando em quem assiste uma série de incômodos, e é justamente essa provocação que faz de Koyaanisqatsi uma obra tão singular. A começar pelo nome, o filme rapidamente mostra a que veio. De origem Hopi - nação indígena estadunidense - koyaanisqatsi significa “vida fora de controle”. Para além da dificuldade de ser escrito e pronunciado, o título é ainda mais revelador quando entendemos seu sentido. Participante de uma organização social diferente da nossa, o olhar estrangeiro trazido à tona por meio da referência indígena observa a vida que levamos em nossa sociedade e dá o veredito: aí, onde o consumo dita o ritmo das relações, a vida está fora de controle. Dito isso, temos que nos perguntar: que vida é essa que Reggio explora no filme? O que exatamente está fora de controle? Essas são perguntas cruciais que são respondidas pelo diretor em forma de arte cinematográfica experimental, provocativa e, acima de tudo, engajada. A vida que Koyaanisqatsi mostra é a que vivemos no capitalismo moderno, expresso pela sociedade do consumo. Nesse tipo de organização nós somos o que consumimos, e é só quando fazemos isso que aparecemos como cidadãs e cidadãos do mundo. Por mais cruel que seja, essa equação parece simples: para ser, é preciso consumir. Mas o que significa consumir? Trata-se apenas de comprar, utilizar e descartar produtos? Koyaanisqatsi dá a resposta, e ela é negativa. Uma das grandes genialidades do filme está em mostrar que consumir implica não apenas em transações de objetos por dinheiro. Consumir envolve, antes de qualquer coisa, produzir para vender, e essa produção consiste na transformação dos recursos naturais em itens de valor. Nesse sentido, o capitalismo se mostra fortemente dependente da natureza, que já há anos dá sinais de que não suportará o ritmo de produção que temos. Diferente do que pensávamos, essa relação não será infinita e está em constante declínio, e a produção de Reggio nos mostra essa constatação em uma mistura de frames acelerados, ora descontrolados, que mesclam cenas da natureza e do cotidiano urbano em uma relação caótica, rápida, sufocante, e, acima de tudo, desequilibrada. Diante desse quadro, fica a pergunta se o equilíbrio entre a sociedade do consumo e a natureza se restabelecerá, se ainda temos tempo de reverter essa relação tão desigual que criamos. Enquanto tentamos responder, seguimos vivendo assim: koyaanisqatsi. Alice de Souza Araújo Graduanda em Ciências Sociais (FFLCH/USP) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2019-2020. #Koyaanisqatsi #sociedadedoconsumo #capitalismoenatureza #desequilíbrio #vidaforadecontrole
- De volta à Ilha das Flores 30 anos depois
Fonte: 'Ilha das Flores', curta documental de Jorge Furtado lançado em 1989 /Divulgação #PraCegoVer [FOTOGRAFIA]: Crianças em situação de pobreza sentadas sob os entulhos em uma lugar que aparenta ser o aterro Ilha das Flores, com justamente um girassol ao centro da imagem, contrastando sua vívidas cores com a situação de miséria em que se encontra. O ano de 1989 foi um marco na história mundial, sendo considerado por muitos estudiosos o fim do assim chamado “breve século XX”, cujo o principal evento foi a queda do Muro de Berlim, sendo antecedido e sucedido pelo colapso dos governos alinhados à União Soviética. A partir disso, foi cantada a vitória do modelo liberal-capitalista, sendo inclusive decretado, pelo filósofo nipo-americano Francis Fukuyama, o que foi chamado de “Fim da História”, se difundindo a ideologia de que todas as transformações a partir dali se dariam dentro dos marcos do capitalismo, pois teria se provado a supremacia deste modelo sócio-econômico sobre o modelo capitaneado pela União Soviética. Este mesmo ano é o ano de lançamento do famoso curta-metragem Ilha das Flores. Esta obra, dirigida por Jorge Furtado e gravada em Porto Alegre, nos narra de maneira ácida, beirando o cinismo, o ciclo da produção e do descarte de uma porção de tomates, até a chegada deste no aterro sanitário que dá nome à obra. O curta se inicia com uma explicação científica sobre o que são humanos e o que são tomates, passando logo depois para uma visão em terceira pessoa do ciclo de consumo em que os tomates se inserem. É muito interessante ver como o narrador também descreve como outros processos sociais que ocorrem simultaneamente ao que podemos chamar de “ciclo do tomate” cruzam seu caminho e estão intimamente relacionados à dinâmica de consumo. Podemos citar o caso da dona Anete (Julia Barth), vendedora de perfumes que através dos lucros de suas vendas compra em um supermercado os tomates plantados na fazenda do sr. Suzuki (Takahiro Suzuki), onde tudo começa. Nos expondo onde ela se encontra no esquema de vendas, é dado para nós, espectadores, o contexto do capitalismo em que ela se encaixa. O curta ganha um tom mais pesado quando nos é apresentado a Ilha das Flores, aterro sanitário nas imediações de Porto Alegre. É para lá que um tomate comprado por dona Anete é encaminhado, após esta o descartar por estar apodrecendo. Então, nos é mostrado que há uma criação de porcos no aterro, e o que os materiais orgânicos que para lá foram encaminhados sofrem um processo de seleção, em que os “melhores dos piores” são escolhidos para servirem de comida para os porcos de lá. A reviravolta se dá quando nos é mostrado que os restos orgânicos que foram considerados ruins até mesmo para servir de alimento para os porcos são coletados por pessoas em situação de miséria que buscam alimentos no aterro. Nesse momento, a linguagem utilizada pelo autor, que durante todo o curta constitui uma narrativa “objetiva” e “científica”, ajuda a desvelar uma latente contradição que é parte essencial do capitalismo: a esmagadora desigualdade social, e que nos leva a um questionamento imediato: para quem os recursos são escassos? Quando descreve as pessoas que tiravam sua alimentação dos restos do aterro, fica claro para o público o que os diferencia. E isso é a pobreza, não ter dinheiro para dispor de condições mínimas de dignidade. Essas pessoas se encontram claramente fora do ciclo de consumo, podendo ser questionado também a quem é destinado os frutos da produção em massa desse final de século. 30 anos depois, a atualidade da Ilha das Flores é chocante. Em um mundo cada vez mais desigual, há de sempre se questionar para quem os recursos são escassos e a quem o consumo é destinado. Num sistema que se diz o campeão da liberdade, vale relembrar a frase que fecha o curta: "Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta, que não há ninguém que explique e ninguém que não entenda". Luis Guilherme Nobrega Amorim Graduando em Ciências Sociais (FFLCH/USP) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2019-2020. #Consumo #Capitalismo #Desigualdade #Alimentação #CurtaMetragem
- A Utopia da Sustentabilidade
#PraCegoVer [FOTOGRAFIA]: Gado de corte com expressão abatida atrás das grades do pasto onde é criado seu rebanho, em seu corpo está a imagem do planeta terra, onde aparece o continente americano e oceanos pacífico e atlântico, com nuvens brancas que contrastam com sua pele e rosto, ao fundo encontra-se um pôr do sol em tons de laranja e levemente avermelhados. Em se falando de sociedade do consumo e escassez dos recursos naturais, podemos nos lembrar de um dos grandes marcos da história no século XVIII - A Revolução Industrial - período em que foi fomentado de forma intensa e irracional o consumo pelos recursos naturais, causado pelo crescimento exponencial da população humana e pela crescente demanda por alimentos. Desde então, a cultura do consumismo está inserida na sociedade, de forma que o consumo é incentivado com o propósito de estimular o progresso das nações, utilizando o meio ambiente como toda e principal fonte de recursos para nós humanos, tais recursos esses, totalmente finitos. Esse consumismo diário e o uso descontrolado de combustíveis fósseis são agentes da destruição do planeta juntamente a um grande responsável: o agronegócio. A criação de animais em massa é causadora de várias mudanças no meio ambiente, é responsável pela liberação do CO2 e do Metano que contribuem para o efeito estufa, por 30% do consumo de água do mundo, ocupa 45% do espaço na Terra, causou 91% da destruição na Amazônia, extinguiu espécies e habitats. No documentário Cowspiracy – O Segredo da Sustentabilidade (2014) o cineasta Kip Anderson e o cinegrafista Keegan Kuhn abordam esse cenário na tentativa de entrar em contato com diversas ONG’s ambientalistas a nível mundial e pessoas influentes na discussão. Kip analisou a postura das grandes ONG’s e nenhuma delas estava dando a devida importância para a degradação do meio ambiente causada pela pecuária, devido à economia e capital que gira em torno das nações através da criação de gado, porém muito além da exploração animal: a criação de gado promove consumo de recursos naturais e danos ambientais em escala estratosférica. Sendo assim, Kip através de pesquisas e infográficos bem didáticos nos esclarece vários pontos, com o intuito de apontar os benefícios de uma dieta vegetariana ou melhor ainda vegana, para a saúde humana. Ele fez um estudo que classificou as carnes processadas como cancerígenas e a carne vermelha como potencialmente cancerígena, simultaneamente com uma série de outras informações muito importantes que podemos encontrar no documentário: Uma exploração agrícola com 2,5 mil vacas leiteiras produz a mesma quantidade de resíduos que uma cidade de 411 mil pessoas. Os EUA poderiam alimentar 800 milhões de pessoas com grãos que o gado consome. A pecuária e seus derivados são responsáveis por, pelo menos, 32 milhões de toneladas Co² por ano, ou 51% de todas as emissões de gases de efeito estufa em todo o mundo; Um hambúrguer exige 660 litros de água para ser produzido, o equivalente a dois meses de banhos de chuveiro; 2.500 litros de água são necessários para produzir 1 kg de carne; A exploração excessiva dos mares indica que em 2048 não haverá mais peixes comestíveis no mar; A agropecuária é responsável por 91% da destruição da amazônia; Mais de 6 milhões de animais são mortos por hora para alimentação humana; A produção de alimentos vegetais exige muito menos espaço de terra do que a produção de alimentos de origem animal; Por dia, uma pessoa que come uma dieta vegana poupa 1.100 litros de água, 45 quilos de cereais, 2,79 m² de terrenos florestais, 9 kg de Co² e a vida de um animal. Portanto, a mensagem que Cowspiracy nos deixa é que falar de sustentabilidade num mundo onde praticamente tudo é medido através do dinheiro, torna-se utopia. Kip Anderson também nos deixa o desafio e a importância de reduzirmos o consumo de carne para salvar nosso planeta, pois não existe uma indústria que prejudique tanto o meio ambiente como esta, que comer também é um ato político e que ao decidirmos o que está presente em nossa alimentação, também estamos decidindo o rumo que nosso planeta irá tomar futuramente. Stephanie Gabriele Mendonça de França Graduanda em Engenharia de Produção (POLI/USP) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2019/2020. #Agronegócio #Consumo #RecursosNaturais #Animais #Alimentação
- Sobrevivendo para consumir
#PraCegoVer: [FOTOGRAFIA]: Quadro do filme Surplus - Aterrorizados pelo consumo. A imagem mostra um letreiro escrito “Economize: Consuma Apenas o Necessário” em espanhol, ao lado de uma rodovia. Desde o surgimento da humanidade no planeta Terra, vivemos uma grande busca por sobrevivência. Tendo em vista essa necessidade, os seres humanos primitivos, em uma cultura de subsistência, utilizavam os recursos naturais sem outras intenções. Até que o homem adquiriu consciência e conhecimento de que matérias-primas poderiam ser utilizadas como meio para acumular capital. Passando pela Idade Média e Feudalismo, chegamos ao sistema econômico que dita as regras no mundo contemporâneo, o Capitalismo. O Capitalismo, pode-se dizer que, é uma consequência de inúmeros fatores políticos, econômicos e sociais que resultaram em uma cultura de consumo absoluto e total ‘apreço’ ao capital. A Revolução Industrial mudou o pensamento no que tangia à produção. Antes os artesãos detinham o conhecimento técnico para produzir, mas com a invenção das máquinas os fabricantes não eram mais limitados à simples capacidade humana, portanto a produção começou a aumentar exponencialmente. Isso nos traz ao século XX, com o nascimento de grandes corporações e sistemas de informação. Não só produtos materiais são colocados na linha produção, mas também há a fabricação de pensamentos e necessidades. O consumismo é consequência do marketing, da promessa das empresas de que se as pessoas consumirem seus produtos elas serão felizes e da fabricação de necessidades que, na verdade, não existem. A busca pela felicidade na compra é incentivada pelos meios de comunicação e também pelo sistema político nos países desenvolvidos, baseado na liberdade americana de que a liberdade real é a liberdade de consumo. O documentário Surplus: Aterrorizados Para Consumir [1] (Erik Gandini) começa uma discussão exatamente sobre esse ponto. Lançado em 2003, demorou três anos para ser concluído e apresenta filmagens da China, EUA, Cuba, Itália, Hungria, Índia, Canadá e Suécia, e é editado utilizando os sons e imagens de cada país para criar cenas incríveis que criticam a postura de líderes mundiais, tanto políticos quanto CEOs de grandes empresas. O começo do filme apresenta cenas violentas de protestos no 27º encontro do G8 em Gênova. As manifestações também ficaram conhecidas por Batalha de Gênova e foi marcada pela morte do manifestante Carlo Giuliani, alvejado por um policial, e pelo caráter violento e repressor que as forças policiais italianas lidaram com os manifestantes. Enquanto as cenas passam no filme, um discurso de Fidel Castro contra as sociedades de consumo é colocado ao fundo, no qual ele diz que as sociedades de consumo são responsáveis pela destruição do meio ambiente. Esse conjunto dita o ritmo do resto do filme. Diversos pronunciamentos, palestras e entrevistas de líderes mundiais como George Bush, Steve Ballmer e Bill Gates são postos em xeque quando estes incentivam o consumo e destacam a liberdade de consumir. Discurso do ex-presidente dos EUA, George Bush: “Não podemos deixar com que o terrorismo atinja seu objetivo de intimidar nossa nação ao ponto de que não possamos mais… Onde pessoas não possam mais comprar”. Mostra que o principal objetivo da sociedade é manter sua “liberdade” de comprar. Em contrapartida, o filme entrevista o filósofo anarquista John Zerzan que diz: “Trabalhar constantemente e consumir constantemente. É loucura. Está destruindo tudo, vai tudo desaparecer”. Se referindo à exploração massiva de recursos naturais. Ponto fundamental no filme e que deve ser pensado criticamente quando o seguinte dado aparece: O padrão de consumo dos países de primeiro mundo conta com 20% da humanidade consumindo 80% dos recursos produzidos no planeta. Portanto, se esse padrão fosse igual para todo mundo, precisaríamos de mais dois ou três planetas. O grande argumento do filme, mesmo sendo lançado vinte anos atrás, se sustenta no fato de que, atualmente, tudo pode se tornar um produto de consumo, desde informações até produtos materiais. Isso, aliado com os padrões de consumo dos países desenvolvidos, está custando muito caro para o nosso planeta. A exploração não se justifica mais pela sobrevivência e sim pela necessidade, fabricada pela propaganda, de comprar e, consequentemente, ser feliz. Desse modo, se nada mudar, estaremos atraindo para nós mesmos nossa destruição. Mateus Pontes Ruivo Graduando em Educomunicação (ECA/USP) e bolsista do Projeto CineGRI (2019-2020). Referências: Surplus: Aterrorizados Pelo Consumo. Erik Gandini, 2003. Disponível em: . Acesso em: 31/01/2020. BAPTISTA, Vinícius Ferreira. A relação entre o consumo e a escassez dos recursos naturais: uma abordagem histórica. Saúde & Ambiente em Revista, v. 5, n. 1, p. 8-14, 2010. Disponível em: Acesso em: 31/01/2020. CRUZ, Leonardo. Manifestação antiglobalização tem na Itália a primeira morte. Folha de S. Paulo, São Paulo, 21 de Julho de 2001. Mercado. Disponível em: . Acesso em: 31/01/2020 #Consumo #Política #Economia #RecursosNaturais #Capitalismo
- Autoritarismo, Primavera Árabe e revolução inacabada
Fonte: Uol Notícias #PraCegoVer [Fotografia]: Na parte inferior esquerda vemos um aglomerado de cabeças em meio a certa escuridão, enquanto que no canto superior esquerdo vemos um feixe de luz amarelado iluminando parte desse todo que se encontra mais espaçada. A transição de um regime autoritário para um regime democrático é sempre um processo complicado, podemos observar isso aqui mesmo, no Brasil. Nossa jovem democracia foi restabelecida em 1985 quando houve a primeira eleição direta após longos anos de ditadura militar. Ainda hoje ela sofre com sequelas de seu período de autoritarismo e por diversas vezes é abalada. Se em nosso país, onde possuímos mais liberdade política e ideológica em relação ao oriente médio, foi - e ainda é - um árduo processo para garantir a democratização do governo e as liberdades individuais, não seria diferente nos países onde houve a chamada “Primavera Árabe". O movimento que se iniciou na Tunísia em dezembro de 2010 com a derrubada do ditador Zine El Abidini Ben Ali parecia germinar flores tão fortes capazes de se estenderem para diversos países vizinhos, como: Líbia, Egito, Argélia, Iêmen, Marrocos, Bahrein, Síria, Jordânia e Omã; era de fato uma primavera. O caso do Egito foi retratado muito bem no documentário "18 dias de revolução inacabada" (Jon Alpet, 2011 transmitido pela HBO. O longa metragem narra o retorno do jornalista Sharif Abdel Kouddous, que vive há anos nos EUA, para seu país. Ali o ditador Mohammed Hosni Mubarak esteve durante 30 anos no poder estabelecendo leis rígidas para continuar nele, leis como por exemplo, a que proibia mais de três egípcios de se reunirem em público. Diversos foram os fatores que contribuíram para a insurreição popular no Egito, como o “reacendimento” das tensões religiosas do país após a morte de 21 cristãos na explosão de uma igreja na cidade de Alexandria. Os egípcios também reivindicavam o fim da ditadura de 30 anos e desejavam a transição do governo para a democracia, ou seja, a abertura política. A sociedade egípcia vivia sob a imposição política de Mubarak. Os principais motivos das manifestações populares foram os altos índices de desemprego, o autoritarismo do governo ditatorial, os altos índices de corrupção, a violência policial, a falta de moradia, a censura à liberdade de expressão, as péssimas condições de vida e a solicitação do aumento do salário mínimo. Após os protestos na Tunísia darem certo a população se motivou a ir contra o governo iniciando os protestos de 18 dias pedindo a renúncia do ditador. Onde não podia haver mais de três egípcios, na praça pública de Tahir - a mais famosa do país - agora havia milhões, clamando em uni som a destituição do poder de Mubarak. Em meio ao protesto haviam idosos, jovens e crianças, alguns gritavam "... Mubarak, por quanto você vendeu o Egito?". O jornalista filmava as escondidas a realidade do país, completamente desigual (já que é proibido por lei filmar ali). Segundo o documentário, mais de 40% da população sobrevivia com menos de 2 dólares por dia, sem direito à saúde básica nem educação. Os protestos foram cruciais para destituir o ditador que renunciou no 18° dia. As primeiras eleições após este estopim foram no dia 28 de novembro de 2011. Entretanto, como o Egito é um país dividido por tensões religiosas que segregam a população atualmente a democracia deles ainda sofre riscos. Para se consolidar todas as mudanças apenas nove anos não foram suficientes, mostrando assim que a revolução está, como diz o nome do documentário, ainda inacabada. Lucas G. de Oliveira Graduando em Letras (FFLCH-USP) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2019/2020.
- Democracia em Vertigem?
Fonte: Jornal El Pais #PraCegoVer: [FOTOGRAFIA] Na imagem, Dilma Rouseff, ex presidente do Brasil, aparece de mãos dadas e erguidas com o ex-presidente Lula e aparenta estar emotiva, enquanto Michel Temer, mais afastado, observa os dois e bate palmas. Passados mais de dois anos após o fim do processo de impeachment de Dilma Rousseff, consumado em agosto de 2016, uma série de produções cinematográficas documentais nacionais tem se proposto a discutir o cenário político brasileiro que envolve os movimentos e articulações responsáveis pela destituição da ex-presidenta. Democracia em Vertigem (Petra Costa, 2019), por exemplo, apresenta uma narrativa que se inicia ainda no governo Lula e se expande até a eleição de Jair Bolsonaro em 2018, entrelaçando memórias históricas pessoais aos fatos políticos. Ao apresentar imagens exclusivas dos bastidores do processo, expondo negociações, discussões e frustrações políticas, documentários como o de Petra endossam a disputa de narrativas, ainda em debate, sobre a legitimidade e a intencionalidade da destituição de Dilma Rousseff. Mais do que isso, estes evocam uma aura de degradação do fazer político nacional, a partir do esgotamento dos atores institucionais, principalmente dos políticos e partidos tradicionais, e da sistematização de práticas corruptas e da transformação dos interesses das elites em interesses nacionais. Entretanto, para entender esse cenário, é preciso voltar no tempo e analisar a história política brasileira para além do segundo mandato de Dilma. Embora de maneira simplista, Petra Costa avança em relação a outros documentários anteriormente produzidos sobre a temática ao construir pontes e diálogos entre os episódios do passado e os do presente. Resgatando memórias do período ditatorial e da construção de Brasília, Democracia em Vertigem expõe como a escória da genealogia da política brasileira esteve presente durante os governos petistas e no processo de sua deposição. A representação potente de Lula como a demonstração máxima do exercício democrático e de uma agenda reformista, simbolizada em forma de esperança para milhares de brasileiros, se contrapõe à prática conciliatória e corruptiva de alinhamento aos interesses do mercado e dos grandes bancos. Não apenas, os massivos escândalos de corrupção envolvendo os partidos da base aliada lulista no Mensalão de 2005 denunciam como a sustentação dos governos petistas se deu, em grande parte, às práticas denunciadas pelo partido ao longo de sua existência. Para Petra, essa imersão em uma lógica que desvaloriza as alianças programáticas e se rende ao funcionamento sistemático aparelhado é fundamental para entender o impeachment de Dilma. Petra, pertencente à família Andrade Gutierrez, uma das principais envolvidas nos escândalos de corrupção nacionais dos últimos vinte anos, enquanto diretora, busca mostrar como, em suma, o impeachment de Dilma é construído, principalmente, para a manutenção de um sistema que tem como pilar fundamental a transformação dos interesses das elites em interesses nacionais. O filme dirigido por Douglas Duarte, Excelentíssimos (2018), em complemento, explora com afinco como o chamado baixo clero, aliado dos governos petistas até o período anterior ao impeachment, em consonância com os partidos derrotados na eleição de 2014 e o próprio PMDB, se articulam para a tomada do poder. David Adler, em artigo publicado no The New York Times [1], argumenta que uma das principais ameaças para democracia na atualidade são os políticos de centro. Segundo o pesquisador, centristas são os mais céticos em relação à democracia e aos direitos civis, superando, inclusive, a extrema direita. Ao pensarmos no caso brasileiro, ainda que Jair Bolsonaro, um dos principais representantes da extrema direita no Ocidente, tenha sido democraticamente eleito, sua vitória só foi possível a partir de dois fatores diretamente ligados ao centrão: o aumento massivo do antipetismo, fortemente construído com o apoio das bases ruralistas e conservadoras do Congresso, e a fortificação dos minúsculos partidos de centro, como o PSL, partido pelo qual o atual presidente foi eleito. Em momentos de crise, como os que regiram o segundo mandato da ex-presidenta, as contradições dos projetos políticos se evidenciam e podem, como ocorrido nesse caso, resultar no aprofundamento de aspectos não democráticos de nossas sociedades. Assim, a partir da queda do preço dos commodities, duas das principais sustentações dos governos petistas – a elite empresarial fortemente beneficiada com exonerações fiscais e a elite bancária – arquitetaram a destituição da presidenta e colocaram em pauta um projeto político ultraliberal e extremamente conservador, utilizando como pano de fundo as pedaladas fiscais, prática recorrente à todos os presidentes da República desde a redemocratização, e se aproximando de um grupo político até então secundário – o centrão. O desenrolar dos fatos, os quais culminam na eleição de Bolsonaro, nos levam a questionar, como indaga Petra, se nossa democracia não teria passado apenas de um mísero sonho efêmero. Talvez, este seja o momento para, enquanto sociedade, analisarmo-nos os limites de um sistema que se propõe a ser uma democracia liberal estando baseado na lógica corrupta dos interesses e no uso da justiça enquanto instrumento político. Matheus Miranda Graduando em Relações Internacionais (IRI-USP) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2019/2020. Notas: ADLER, David. Centrists Are the Most Hostile to Democracy, Not Extremists. 2018. Disponível em: