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- Eleições estadunidenses, voto feminino e as sufragistas
#PraCegoVer: [FOTOGRAFIA]: Na imagem há três mulheres em uma manifestação. À direita, duas seguram cartazes com as seguintes frases em ordem: ”Trump/Pence OUT NOW” (Trump e Pence fora já) e ”Fascism cannot be voted out, the people must dove it from power“ (o fascismo não pode ser eliminado, o povo deve retirá-lo do poder). As três mulheres usam máscara e uma capa de gorro vermelho. Fonte: https://www.noticiasaominuto.com.br/mundo/1708138/milhares-de-mulheres-saem-as-ruas-para-protestar-contra-trump-nos-eua Em 2020, completou-se 100 anos da conquista do voto feminino nos Estados Unidos. Esse reconhecimento ocorreu na 19ª Emenda à Constituição pelo Estado do Tennessee em 1920. No ano desse centenário tão importante, ocorreram as eleições presidenciais dos Estados Unidos com a vitória do democrata Joe Biden (51,4%) e sua vice Kamala Harris (primeira mulher negra e asiática americana vice-presidente dos Estados Unidos, que durante sua trajetória trabalhou em prol dos direitos civis). Para entender a importância desse centenário e seu impacto nas eleições estadunidenses, é importante falar do movimento social, político e econômico Sufragistas (1920), que conquistou o direito ao voto feminino. Esse movimento reivindicatório desenvolveu-se no contexto da chamada primeira onda do feminismo. No seu âmbito político, lutou pelo direito de votar e ser votada. Ele é muito bem espelhado na obra cinematográfica: As Sufragistas (Sarah Gravon, 2015), em que diversas mulheres iniciam um movimento que demonstrou a força através da luta pelo voto, e retratou mulheres ocupando juntas os espaços nos quais, neste período (1920), existia uma desigualdade provocada ou motivada pelo gênero. Apesar desta grande vitória, passaram-se 100 anos para os Estados Unidos terem a primeira mulher vice-presidente do país (Kamala Harris). E, para chegar neste triunfo, o ano de 2020 foi marcado por diversas manifestações. As principais motivações para os protestos foram as falas maldosas e machistas do então presidente Donald Trump, que fizeram milhares de mulheres saírem às ruas para protestar contra tais declarações e posicionamentos sexistas, além de defenderem o direito das mulheres e minorias. Essa onda refletiu diretamente no clima acirrado de disputa à presidência dos Estados Unidos. O candidato do Partido Democrata à eleição, Joe Biden, abriu vantagem em relação a Donald Trump em pesquisas nacionais e em estados considerados chave, como Flórida e Pensilvânia. Nos dados acima é possível notar que a porcentagem das mulheres que votaram no democrata Joe Biden é muito maior em relação à porcentagem masculina. Apesar das mulheres brancas terem votado majoritariamente em Donald Trump (55%), o número ainda assim é menor em relação aos homens (58%). Essa preferência expressiva feminina foi de suma importância para a vitória dos democratas e gerou agradecimentos da vice Kamala em uma de suas redes sociais com a seguinte mensagem: "Estou aqui hoje por causa das mulheres que vieram antes de mim". Além disso, a poucas semanas de sua posse, Joe Biden já estava cumprindo a promessa da campanha de ter o gabinete presidencial mais diverso da história americana ao selecionar representantes de minorias para cargos de destaque. O presidente eleito anunciou uma equipe econômica com mulheres que defendem preservar a renda dos trabalhadores, além do fato de a equipe de comunicação da Casa Branca ser formada só por mulheres. O centenário do grande passo das concretizações do sufrágio feminino e das lutas enfrentadas pela igualdade foi importante e decisivo na disputa eleitoral estadunidense. Grande parte das mulheres votou no democrata Joe Biden e deixou viva a esperança por um Estados Unidos mais diverso, feminino e representativo. Pâmela Vitória Nogueira S. Graduanda em Letras (FFLCH-USP) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2020/2021. #EleiçõesEUA #Biden #Trump #Kamala #Sufragistas #Centenário #Eleições2020 Notas e referências bibliográficas: [1] MAHNCKE, J. Joe Biden e Kamala Harris: união das diferenças faz a força. Disponível em: Acesso: 24/01/2021 (17:00) [2] SLIM, D. Milhares de mulheres fazem protesto contra Trump em 400 cidades. Disponível em: Acesso: 24/01/2021 (17:12) [3] DAVIS, Angela. Estarão as prisões obsoletas? Tradução: Marina Vargas, 2. ed. Rio de Janeiro, Difel, 2018.
- Cooperativa Mãos de Mulher Xapuri
#PraCegoVer [FOTOGRAFIA]: Mulher sentada de frente para a câmera está com a mão direita em uma máquina de costura. A mão esquerda está sobre uma almofada que ela costura artesanalmente. Ao fundo, duas mulheres também olham para a câmera, uma costurando e a outra em pé com uma camiseta branca nas mãos. Elas estão em um ateliê de costura. Extraído de: http://4.bp.blogspot.com/_QnX5zpPIaDs/SowhZrMz1sI/AAAAAAAAADo/fK9jXU_0VxM/s1600/fotos%2Bda%2BConcei%C3%83%C2%A7%C3%83%C2%A3o%2Bpessoal%2Be%2Bcooperativa%2B473.jpg “A cooperativa me trouxe independência”. É assim que acaba o relato de uma das mulheres que fazem parte da Cooperativa Mãos de Mulher Xapuri, localizada no Acre. No espaço da cooperativa reúnem-se mulheres artesãs que produzem artesanatos para vender e complementar a renda de suas famílias. Além disso, na cooperativa as mulheres se ajudam, ensinando e aprimorando técnicas de artesanato. Com população de um pouco mais de dezenove mil habitantes, Xapuri é uma cidade do interior do Acre na qual, não diferente de todo o Brasil, a realidade de mulheres em situação de violência doméstica é preocupante. O documentário Cooperativa Mãos de Mulher Xapuri (Elenckey Barbosa Pimentel, 2020) é composto por depoimentos de algumas mulheres que fazem parte dessa cooperativa, e, nele, elas relatam como a independência financeira possibilitou que se libertassem das amarras masculinas que as limitavam, transformando a vida de cada mulher ali presente. Mulheres em posição de chefes de casas no Brasil, inclusive, aumentam anualmente. Se vinte e cinco anos atrás famílias chefiadas por mulheres representavam em média 22%, hoje esse número dobrou e representa 40,5%. No Norte, região em que o documentário Cooperativa Mãos de Mulher Xapuri é feito, 2.134.508 famílias têm essa característica, representando 39,5% das famílias da região. Entretanto, com a pandemia, essas mulheres tornaram-se prioridade para receber o auxílio emergencial. Desde o mês de abril de 2020, seis milhões delas acabaram por receber ajuda governamental. Segundo o IBGE, 56,9% das casas chefiadas por mulheres no Brasil estão abaixo da linha da pobreza. Desse modo, saídas como a Cooperativa atuam em contraponto, auxiliando essas mulheres a terem uma renda extra ao final do mês. Empreender de forma autônoma representa emancipação econômica? Obviamente não podemos generalizar. Medidas governamentais certamente seriam mais efetivas, mas projetos não governamentais estão proporcionando uma forma de transformar o dia a dia desses lares de maior vulnerabilidade econômica. Marcela Sayuri Graduanda em Letras (FFLCH) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2020-2021. #MulheresChefesDeFamília #CooperativaMãosdeMulherXapuri #AuxílioEmergencial #MulheresArtesãs #Acre Referências Bibliográficas: Cooperativa Mãos de Mulher Xapuri (Elenckey Barbosa Pimentel, 2020). https://www.youtube.com/watch?v=XWwLLrX88f4 BARBOSA, Marina e PHELIPE, André. Quase metade dos lares brasileiros são sustentados por mulheres. Estado de Minas, Belo Horizonte, 16 de fevereiro de 2020. Disponível em: . Acesso em: 28 de novembro de 2020. DAMACENO, Victória. Por que famílias chefiadas por mulheres vivem abaixo da linha da pobreza?. UOL, São Paulo, 18 de dezembro de 2018. Universa UOL. Disponível em: . Acesso em: 29 de novembro de 2020. GADELHA, Alcione. Documentário conta história de cooperativa de mulheres empreendedoras no Acre. G1, Rio Branco, 30 de julho de 2020. Disponível em: . Acesso em: 28 de novembro de 2020. MENDES, Mary A. Mulheres Chefes de Família: a complexidade e ambigüidade da questão. ABEP. Disponível em: . Acesso em: 29 de novembro de 2020.
- O Amapá existe!
#ParaCegoVer [FOTOGRAFIA]: No centro da foto, há uma criança desenhando de cabeça baixa, enquanto ao seu redor duas velas estão acesas (uma delas dentro de uma xícara de vidro azul). No fundo, há um breu e a única iluminação da imagem parte das velas. Fonte: https://www.juruaemtempo.com.br/2020/11/19/moradores-se-viram-com-velas-nao-dormem-e-perdem-eletrodomesticos/ Quem tem medo do escuro? O Amapá inteiro. O estado do Norte brasileiro sobreviveu mais de vinte dias sem energia elétrica - um descaso que se intensifica ainda mais pela situação de pandemia que o mundo vive. A negligência das autoridades brasileiras acarretou não só a revolta aos amapaenses como também o medo: o temor pelos pacientes que estão nas UTIs, maternidade e pediatria. Esse atendimento direto à população, em algum momento, foi suspenso devido à falta de energia porque não há geradores. O prejuízo financeiro, de saúde e do bem estar não se equiparam ao sentimento de maior perda: o esquecimento. Esse só deixa mais escancarada a vulnerabilidade social das regiões Norte e Nordeste. Em 2019, Julio Berdegué (representante regional da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO)) afirmou que o Nordeste e Norte brasileiro são algumas das regiões mais esquecidas e invisibilizadas da América Latina e Caribe. Esse dado se reitera com a situação do Amapá porque é a comprovação do esquecimento da população local que agora, mais do nunca, sentiu na pele o descaso daqueles que pouco o representam: "Ficamos na escuridão, só na vela, e a gente tem que se recolher, porque somos obrigadas. Somos obrigadas a desligar tudo, porque a hora em que chega pode queimar os aparelhos e o prejuízo é para a gente. Ninguém faz nada. O povo amapaense está abandonado" desabafa Rozineide Cardoso, moradora da periferia de Macapá, em entrevista para o Brasil de fato. [1] O discurso de moradores mobilizou milhares de pessoas anônimas e famosas nas redes sociais com uso da hashtag #SOSAmapá como meio de denúncia e cobrança. Manifestantes também foram às ruas protestar pela regularização do fornecimento de energia. No entanto, tais protestos não foram suficientes, pois o apagão durou mais de vinte dias, situação inacreditável, tendo em vista que essa calamidade não aconteceria em grandes metrópoles como, por exemplo, São Paulo. E se muito hipoteticamente ocorresse algo assim, mantendo os bairros ricos de São Paulo sem luz, o governo conseguiria o mais rápido possível o restabelecimento. O documentário "O Acre existe" (Bruno Graziano, Milton Leal, Paulo Silva Jr. e Raoni Gruber, 2014) inicia-se com uma afirmação de um comediante: "Na verdade, não sei se você sabe, mas o Acre existe!". Apesar da fala ser descontraída e carregada de humor, por detrás revela-se um problema muito grande, pois diversos estados das regiões Norte e Nordeste são tratados com esquecimento por uma parcela grande da população brasileira e também pelas políticas públicas, resultando nesse sentido descaso que reitera a fala de Julio Berdegué. #ParaCegoVer [FOTOGRAFIA]: Uma mulher de máscara segura um cartaz com a seguinte frase: “O Amapá existe! #SOSAmapá” Fonte: https://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2020/11/eletronorte-diz-que-causa-de-novo-apagao-pode-ter-sido-falha-na-distribuicao/ “A dignidade de um país é do tamanho da dignidade daqueles que ele deixa para trás. Como o abandono é consciente, não somos um fracasso por acidente. Somos um projeto de fracasso.” (Leonardo Sakamoto- colunista) [2] Diante disso, o questionamento que fica é como o Brasil pode pensar em progresso ignorando os problemas que nem deveriam existir em diversos estados do Brasil. A tragédia anunciada é a comprovação de que o país pouco resolve e muito banaliza. O Amapá resistiu bravamente e deixou para o Brasil uma mensagem muito importante: O Amapá existe! Pâmela Vitória Nogueira Silva Graduanda em letras (FFLCH) e bolsista do Projeto CineGRI, ciclo 2020-2021. #Amapá #SOSAmapá #Apagão #Blecaute #Brasil #Esquecimento Referências bibliográficas: [1] BARBOSA, Catarina. Apagão no Amapá completa 15 dias: estado mantém rodízio e periferia amarga prejuízos. Disponível em: . Acesso em: 03 de dezembro de 2020. [2] SAKAMOTO, Leonardo. Com novo apagão no Amapá, Brasil mostra que cidadania é produto de luxo. Disponível em: . Acesso em: 03 de dezembro de 2020.
- “Cinema, Aspirinas e Urubus”: os apagões que marcam a desigualdade brasileira
#PraCegoVer [Fotografia]: Na imagem há dois homens sentados em uma mesa. À esquerda está o personagem Johann, que sorri enquanto conversa com Ranulpho, à direita, também sorridente. No meio da mesa há uma garrafa de pimenta pela metade. Ao fundo há uma parede velha com muitos buracos. É fato que o Brasil tem como uma de suas principais características sociais a desigualdade de renda. Esse abismo fica ainda mais evidente quando mobilizamos marcadores como gênero e raça, comprovando que esse desequilíbrio se dá de forma estrutural. Quando voltamos nosso olhar para as diferentes regiões do país, podemos observar que essa assimetria social também opera no campo geográfico. Historicamente, o Norte e Nordeste do Brasil sofrem com a negligência dos governos federais, fato que reflete diretamente no panorama social desses estados. Nos últimos 18 anos, programas de transferência de renda como o Bolsa Família ajudaram a mitigar a miséria e fome da população, mas as crises econômicas recentes foram suficientes para trazer de volta os problemas estruturais já conhecidos. Segundo estudo publicado pela Fundação Getúlio Vargas em 2019, as grandes recessões que assolaram o Brasil entre 2014 e 2016 atingiram diretamente as regiões Norte e Nordeste, aumentando os níveis de desigualdade de renda em aproximadamente 5%. O filme “Cinema, Aspirinas e Urubus” (Marcelo Gomes, 2005) aborda diretamente essas questões com um roteiro envolvente e bem estruturado. O enredo se passa na década de 1940 e conta a história de Johann (Peter Ketnath), um alemão foragido da Segunda Guerra que percorre o sertão nordestino com seu caminhão, utilizando o cinema como ferramenta para propaganda das Aspirinas que comercializa. Durante seu trajeto, o viajante conhece Ranulpho (João Miguel), sertanejo que sonha sair do Nordeste e transformar sua realidade. O choque entre essas experiências e histórias conflitantes resulta em uma jornada de descobertas nada previsível. É interessante observar como as desigualdades sociais evidentes são mobilizadas entre os personagens. Enquanto Johann tem uma postura de resignação, enxergando todo o cenário com certa frieza, Ranulpho demonstra constante raiva e indignação. Ambos os personagens buscam fugir de suas realidades nas quais a morte, a fome e a violência são marcantes, tanto no contexto da guerra quanto no sertão do Nordeste. O sonho de Ranulpho é voltar ao Rio de Janeiro, conseguir um emprego e viver com dignidade, além de poder mostrar para todos aqueles que o humilharam em sua primeira empreitada rumo à grande metrópole que ele é digno de respeito e que se orgulha de sua origem nordestina. A escassez de escolhas, inerente ao contexto social abordado, também é introduzida pela produção. Embarcar num trem superlotado rumo ao Amazonas para trabalhar na produção de borracha em terríveis condições, tentar a sorte na busca de um emprego na região Sudeste ou continuar na situação de miséria do Nordeste. As três alternativas oferecem um bom panorama social do Brasil na época retratada. Voltando para nosso contexto atual, podemos observar que o recente apagão no Amapá é a “ponta do iceberg” de uma questão estrutural marcada pela disparidade, xenofobia e descaso. Nossa postura enquanto cidadãos brasileiros deve ser de denúncia e cobrança constante do poder público para que cumpram com o princípio de igualdade e justiça social previstos na Constituição. A desigualdade regional no Brasil é um projeto que se perpetua ao longo das décadas. Tal situação só se transformará com projetos e políticas públicas progressivas concretas que sejam capazes de diminuir a concentração de renda para solucionar permanentemente os abismos que permeiam toda nossa história. Yan Carvalho Estudante de Ciências Sociais – USP #norte #nordeste #amapá #cinema #xenofobia Referências bibliográficas: Desigualdade sobe e afeta mais o Norte e Nordeste. Tribuna do Norte, 12 de dezembro de 2019. Disponível em: http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/desigualdade-sobe-e-afeta-mais-o-norte-e-o-nordeste/468238. Acesso em: 01 de dezembro de 2020. Apagão no Amapá: veja a cronologia da crise de energia elétrica. G1, 18 de novembro de 2020. Disponível em: https://g1.globo.com/ap/amapa/noticia/2020/11/18/apagao-no-amapa-veja-a-cronologia-da-crise-de-energia-eletrica.ghtml. Acesso em: 01 de dezembro de 2020. Brasil é o nono país mais desigual do mundo, diz IBGE. Exame, 12 de novembro de 2020. Disponível em: https://exame.com/economia/brasil-e-nono-pais-mais-desigual-do-mundo-diz-ibge/. Acesso em: 01 de dezembro de 2020.
- “Martírio” e a denúncia de um genocídio silencioso
#PraCegoVer [Fotografia]: Quatro crianças Guarani-Kaiowá. A primeira tem o rosto pintado de preto. Está de camisa marrom, jaqueta azul e calça branca. Segura um cartaz que diz “nós queremos demarcação já”. A segunda tem o rosto pintado de preto, usa camisa verde e calça laranja. Segura um cartaz que diz “para de enrolação”. A terceira tem o rosto pintado de preto, usa camisa rosa e calça branca. Segura um cartaz que diz: “Pelo amor de deus parem o massacre contra os povos indígenas Guarani. Mato Grosso do Sul. Demarcação das terras já!!!”. A terceira tem o rosto pintado de vermelho, usa camisa azul e calça rosa. Segura um cartaz com mensagem inelegível. O chão é de terra batida e atrás das crianças há uma pastagem de mato alto”. Extraído de: http://candidoneto.blogspot.com/2015/09/a-dolorosa-resistencia-dos-guarani.html Brasília, 5 de outubro de 1988. Após anos de esforço e articulação política das principais organizações indigenistas do Brasil, lideradas pela figura de Manuela Carneiro da Cunha, o Brasil finalmente publicava o Capítulo dos Índios. A garantia dos direitos constitucionais das populações indígenas significou um marco na trajetória de luta e sobrevivência de uma minoria étnica, historicamente violentada e desassistida pelo poder público. Ainda assim, 32 anos depois dessa conquista histórica, o que vemos é um cenário desolador, de violência sistemática e ataque contra os direitos básicos de sobrevivência dessas populações. Em Martírio (2016), Vincent Carelli expõe esse panorama e, com seu rico acervo de imagens, dá visibilidade à toda a situação degradante vivida pelos Guarani-Kaiowá. O diretor faz um percurso histórico pela questão indígena, mostrando que a luta pela terra e toda a violência promovida pelos latifundiários é um problema antigo, muito longe de ser resolvido. Carelli não tem medo de apontar os verdadeiros culpados pela situação, por isso, parte fundamental do documentário se dá entre os contrastes. O filme alterna entre depoimentos dos indígenas e filmagens das sessões na câmara dos deputados, onde fica evidente todo o lobby e malabarismo argumentativo daqueles que formam a denominada “bancada do boi” no Congresso Nacional. Constantemente se observa uma tentativa de colocar a culpa nos indígenas pela situação de violência, classificando-os como “invasores”, ainda que estejam lutando pela ocupação de terras que lhes foram garantidas constitucionalmente. “Por aqui parece que cabeça de gado vale mais do que gente”. A frase proferida por um desembargador incrédulo com a violência promovida pelos fazendeiros contra os Guarani-Kaiowá explica como as relações de poder se dão nesse território. Todo o derramamento de sangue de vidas inocentes parece não ser o suficiente para chocar a opinião pública nem gerar medidas incisivas por parte das autoridades. Uma série de assassinatos e massacres que não resultam em nenhum tipo de condenação provam que as milícias formadas pelos fazendeiros no Centro-Oeste do Brasil estão acima da lei. A lógica que coloca economia e vida em polos opostos parece ser o suficiente para justificar o genocídio promovido contra os índios. Em sua retomada histórica, o diretor explora a maneira com que o manejo dos povos indígenas se deu ao longo do tempo. As práticas do Serviço de Proteção ao Índio (SPI), chefiado pela figura do positivista Marechal Rondon, que tinha como objetivo transformar os índios em “civilizados”, são amplamente expostas e problematizadas, por ter o intuito principal de assimilar e acabar com a cultura nativa. A marcha desenvolvimentista, marcada pelo governo de Getúlio Vargas, é apontada como motor do processo de desapropriação das terras indígenas. Naquele contexto, mais uma vez, o desenvolvimento econômico do país estava acima dos direitos constitucionais que os indígenas já possuíam. Martírio é um grito de socorro, o retrato de uma violência sistêmica que mata milhares de brasileiros todos os anos. O que devemos nos perguntar é: por que isso não nos choca? É justo que estejamos naturalizando a barbárie? Quantas vidas terão de ser perdidas para que tomemos uma posição enquanto sociedade? Mudar essa situação passa por um esforço conjunto de fazer essas vozes serem ouvidas. É fundamental que cada vez mais lideranças indígenas ocupem espaços de poder que, historicamente, não foram capazes de garantir seus direitos fundamentais. Só é possível afirmar que estamos em uma democracia plena quando os direitos fundamentais de todos os brasileiros forem assegurados e isso passa, fundamentalmente, pelo fim do martírio vivido pela população indígena. Yan Carvalho. Estudante de Ciências Sociais da USP. #guarani #kaiowá #martirio #genocidio #demarcacao Referências bibliográficas: 30 anos da Constituição e do capítulo dos índios. Comissão Pró-Índio de São Paulo, 04 de outubro de 2018. Disponível em: https://cpisp.org.br/30-anos-da-constituicao-e-capitulo-dos-indios/ Acesso em: 03 de novembro de 2020 BONIN, Iara. Resistência Guarani e Kaiowá e as novas ofensivas contra os direitos indígenas no MS. Intersindical, 08 de Setembro de 2015. Disponível em: https://www.intersindicalcentral.com.br/resistencia-guarani-e-kaiowa-e-as-novas-ofensivas-contra-os-direitos-indigenas-no-ms/#.X6M1h1hKjIU. Acesso em: 03 de novembro de 2020 TAVARES, Elaine. A dolorosa resistência dos Guarani Kaiowá. Instituto de Estudo Latino-Americanos, 18 de Setembro de 2015. Disponível em: https://iela.ufsc.br/povos-originarios/noticia/dolorosa-resistencia-dos-guarani-kaiowa. Acesso em: 03 de novembro de 2020
- Os desastres e os laços invisíveis que nos unem
#PraCegoVer: Cena do filme Threads, de 1984. Foto em tons opacos, neve caindo, fundo desfocado. No centro, um policial de trânsito, identificado pelo Quepe com uma faixa amarela, segurando uma arma, olhando para o horizonte, com o rosto sangrando e enfaixado de modo a cobrir quase todo o rosto exceto os olhos e boca. Fonte: https://www.moviemuse.net/movie-review-threads-1984/ A pandemia da covid-19 não é uma surpresa, pelo menos para as especialistas da área, que há anos alertavam para a possibilidade de que novas doenças epidêmicas pudessem surgir e se espalhar pelo planeta [1]. A surpresa, para a maioria de nós, foi a rapidez com a qual a pandemia revelou o quanto nossas vidas estão conectadas por meio de diversos mecanismos delicados. Por exemplo, nós não costumamos nos preocupar, a princípio, se haverá álcool gel na farmácia ou arroz no mercado; escassez de produtos e aumento veloz de preços são uma face dessa intrincada rede de relações e, principalmente, expectativas, que são fundamentais para que possamos viver e planejar nosso dia a dia. Em países como o Brasil, México e outros do Sul Global, os efeitos dessa quebra de expectativas causada pela pandemia são ainda mais perversos. Primeiro, pela carência prévia que enfrentamos em termos sociais e econômicos. Segundo, pelo fato de vivermos sob governos que deliberadamente se recusaram a reconhecer o perigo e enfrentá-lo de forma coordenada. Nesses últimos 8 meses, as artes têm se revelado algumas das principais riquezas que temos: ao mesmo tempo em que nos permitem escapar da realidade, nos ajudam a dar sentido a ela. Nesse sentido, admito que a realidade do covid-19 está contaminando a forma como vejo filmes: procurando por detalhes relacionados aos novos hábitos, como o uso de máscaras, e tentando relacionar o enredo com a realidade do “novo normal”. Se, quando estamos tristes, gostamos de ouvir músicas tristes porque elas reafirmam para nós a validade de nosso sentimento [2], acho que o mesmo pode ocorrer com nossa inclinação para filmes em determinados momentos da vida. Para mim, nesses tempos são os filmes apocalípticos que se mostram mais adequados às sessões noturnas em casa; nesse texto, destaco dois que me marcaram profundamente. Em março, assisti Threads (1984, Dir. Mick Jackson), um filme britânico feito para a TV, lançado em meio ao recrudescimento da Guerra Fria. Nele, os efeitos de uma guerra nuclear na Inglaterra foram representados em forma de documentário, que conseguiu transmitir como nossas vidas, de todos nós, no mundo inteiro, estão interligadas, e como o rompimento desses fios invisíveis que nos conectam pode levar ao colapso social. Nossas vidas, que parecem tão independentes, na realidade só podem seguir porque milhões de pessoas, realizando suas atividades diárias, sem se dar conta, permitem que nós possamos planejar e viver as nossas. Por fim, a reconstrução é tão pior quanto a guerra; no limite, o trabalho e a luta pela sobrevivência obscurecem as relações humanas a tal ponto que é o sentimento de solidão, que o filme transmite tão bem, que nos marca; um mundo no qual as pessoas precisam tanto umas das outras, mas onde não há mais o diálogo, o afeto. Miracle Mile (1988, Dir. Steve de Jarnatt), eu assisti em maio. Aqui, o idealismo e a euforia de um casal que se apaixona dão lugar ao cenário tão surpreendente quanto quase absurdo de uma guerra nuclear cujo epicentro é Los Angeles. Mas o horror e a ansiedade são contrabalanceados pelos pequenos, mas valiosos, gestos de generosidade, carinho, e pelo sentimento de responsabilidade. Os protagonistas são guiados por esses princípios reforçados em meio ao caos. Com uma excelente trilha sonora feita pela banda Tangerine Dream, a fotografia viva, brilhante pelo uso do Neon, o filme transmite a raiva e desespero mas, no final, a balança pende para a solidariedade e o amor. Não vou exagerar a ponto de dizer que a pandemia da Covid-19 pode se comparar ao tipo de desastre que Threads e Miracle Mile apresentam. Mas o que esses filmes tentam transmitir, o sentimento de surpresa, raiva, solidão e incerteza, certamente permeia nossa realidade com mais força quando estamos todos os dias preocupados com nossa saúde e de nossos familiares, quando se desnudam as intrincadas relações que permitem que nós possamos realizar nossas tarefas diárias; e quando as mesmas responsabilidades continuam chegando. A questão que fica é: como iremos seguir? Nos afastando uns dos outros ou fortalecendo e protegendo os laços invisíveis que nos unem? Laura Pimentel Barbosa Doutoranda em Ciência Política pelo DCP – USP. Mestre em Ciências Sociais pela Unesp-Araraquara e Bacharel em Relações Internacionais pela Unesp-Franca. #Covid-19 #Pandemia #CinemaDeDesastre #MiracleMile #Threads Referências Bibliográficas [1] Daszak, Peter. We Knew Disease X was Coming. The New York Times. Disponível em: . Acesso em 16 de outubro, 2020. [2] Kawakami, Aki. Why we like sad music. The New York Times. Disponível em: . Acesso em 16 de outubro, 2020.
- Eles não são deuses, eles são ladrões e monstros
#PraCegoLer [Ilustração]: Cena do filme animado “Pachamama”. Um campo verde ao fundo e um buraco fundo ao centro, com pessoas ao redor jogando neste buraco suas oferendas. Ao topo, o xamã da comunidade indígena orientando as pessoas que o cercam enquanto fazem o ritual. Fonte: https://i0.wp.com/lugarnenhum.net/wp-content/uploads/2019/08/pachamama-ritual.jpg?fit=1024%2C562&ssl=1 Em outubro de 2020 foi lançado via streaming pela Netflix a animação “Pachamama” (Juan Antin, 2020), filme que aborda de maneira lúdica e delicada a importância da ancestralidade e dos costumes dos povos originários para a manutenção e valorização dessas comunidades, mantendo-as vivas. Pachamama possui como plano de fundo uma comunidade andina, nos arredores da Cordilheira dos Andes, tendo como protagonista um garotinho de dez anos, Tepulpai, que possui aptidão para se tornar um dia xamã. A transição da infância para a vida adulta vem a partir de um ritual importante em oferenda à Pachamama: a deidade mais importante para os povos indígenas dos Andes, cujo significado é Mãe Terra. Ela é representada pela figura de um totem sagrado feito de ouro maciço que é carregado pela matriarca da comunidade, sendo ela o nó que mantém todos unidos. Neste importante ritual, o protagonista Tepulpai se vê confrontado com a perspectiva de amadurecimento, questionando os costumes de seus ancestrais. Porém, quando o totem de Pachamama é confiscado e levado para a capital, Cuzco, Tepulpai não hesita em se arriscar para recuperar aquilo que representa tanto a identidade de seu povo. #PraCegoLer [Ilustração]: Cena do filme animado “Pachamama”. Espanhóis vestidos de armaduras medievais. O líder, ao centro, montado em um cavalo igualmente vestido de armadura. Fonte: https://www.imdb.com/title/tt5541002/mediaviewer/rm1136291840 O mensageiro da cidade, ao testemunhar o desembarque dos espanhóis na praia, acredita estar vendo “deuses metálicos em sua casa flutuante”. Montados em cavalos e com suas espadas, de forma quase monossilábica, os espanhóis só murmuram como um grunhido a palavra “ouro”. "Eles não são deuses, eles são ladrões e são monstros!" é como Tepulpai anuncia a chegada dos espanhóis colonizadores em Cuzco, compreendendo a intenção que eles possuem. E é na sabedoria ancestral e na conexão íntima com a natureza que o protagonista encontra força e estratégia que o levam a combater os invasores, tendo um final de resistência que representa bem um povo que por mais de quinhentos anos sofre violências e extermínios. Pachamama é um importante filme de animação voltado ao público infantil exatamente porque ele descentraliza o protagonismo normalmente eurocentrado e traz atenção para o povo indígena da região andina que sempre foi marginalizada politicamente, culturalmente e na mídia. Movimentos de resistência indígena levantam a voz há séculos e há exemplos atuais, como Adriana Guzmán, de etnia aymara e liderança feminista da Bolívia — país que no dia 18 de outubro realizou eleições gerais após Evo Morales ser coagido à renunciar em 2019 e elegeu Luis Arce, do mesmo partido de Morales (MAS – Movimento ao Socialismo), depois de um atentado da ultradireita no ano anterior. O racismo colonial não é invenção recente e a resistência tampouco. A América Latina abriga 10% da população indígena do mundo, representando em média 40 milhões de pessoas. Países como a Guatemala, a Bolívia, o Peru e o Equador, a população indígena é maior que a dos indivíduos não indígenas. Garantir os direitos de cidadania desses povos é um dever e um assunto que nem deveria estar em discussão. Marcela Sayuri Graduanda em Letras (FFLCH) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2020-2021. #QuestãoIndígena #EleiçõesBolívia #AméricaLatina #DireitosHumanos #Pachamama Referências bibliográficas BASPINEIRO, Roxana. Eleições na Bolívia: "O que está em jogo são as conquistas dos povos indígenas". Disponível: https://www.brasildefato.com.br/2020/10/17/eleicoes-bolivia-o-que-esta-em-jogo-sao-as-conquistas-dos-povos-indigenas LANA, Eliana; TEIXEIRA, Vanessa; URQUIDI, Vivian. Questão Indígena na América Latina: Direito Internacional, Novo Constitucionalismo e Organização dos Movimentos Indígenas. Cadernos PROLAM/USP. São Paulo, 1, P.199-222, 2008
- A verdadeira família tradicional brasileira
#PraCegoVer: Fotografia em preto e branco, quatro pessoas em pé em uma floresta. Menina guató no canto esquerdo, mulher e homem no centro e menino no canto direito. Todos estão descalços e encaram a câmera. Fonte: https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Guat%C3%B3 Através de cerâmicas e restos de alimentos encontrados em Poconé, no Mato-Grosso, um estudo estadunidense demonstrou que a comunidade indígena guató habita o sudoeste do Pantanal desde antes do século XI [1]. Nos anos 50, os guatós foram considerados extintos por doenças como gripe, varíola e tuberculose, por ataques de bandeirantes no século XVIII e o avanço da pecuária e do comércio na década de 1940. Entretanto, nos anos 70, após duas décadas sem qualquer auxílio governamental, foram “reencontrados” por missionários e seu status foi corrigido [2]. O longa-metragem “500 Almas” (2004), dirigido por Joel Pizzini, narra a sobrevivência do povo guató e, simultaneamente, a perda de sua identidade. O filme inicia no Museu de Berlim, onde estão expostos artefatos da cultura, e parte para imagens belíssimas da fauna e flora do Pantanal mato-grossense, abordando a relação íntima dos guatós, etnia canoeira, com a água. Ao longo do filme-ensaio, relatos dos indígenas expõem o desaparecimento da língua, práticas e costumes guató. Concomitantemente, outros relatos mostram a renovação da identidade desse povo, através da autodeclaração indígena. Apesar da impressionante resiliência guató, em 2020, sua existência se encontra novamente em risco: em meio à pandemia do novo coronavírus, o Pantanal passou por uma das queimadas mais severas de sua história, afetando biomas como o Pampa, a Caatinga, o Cerrado, a Amazônia e a Mata Atlântica e populações históricas [3]. Dentre tantas ameaças, infelizmente, o povo guató, e todas as comunidades indígenas, se encontram em incessante luta contra o próprio governo federal brasileiro, que não limita suas palavras e muito menos ações para demonstrar profundo desprezo pela causa indígena. Como uma de suas primeiras medidas tomadas, o governo decidiu pela transição da FUNAI do Ministério da Justiça para o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos [4] e a mudança da responsabilidade da demarcação de terras para o Ministério da Agricultura [5]. Apesar das decisões não terem durado tanto tempo, elas expõem o posicionamento do atual governo e suas tentativas de comprometer a segurança da causa. "Vocês têm na primeira vez da história do Brasil um presidente que está honrando o que prometeu durante a campanha. Um presidente que acredita e valoriza a família.” Em agosto de 2019, durante a “Marcha para Jesus”, típica procissão evangélica, Jair Bolsonaro defendeu mais uma vez o que ele chama de “família tradicional brasileira” [6]. No início do ano seguinte, 2020, em uma transmissão ao vivo através de rede social, ofendeu novamente as comunidades indígenas: "Índio tá evoluindo, cada vez mais é ser humano igual a nós”, ao anunciar Hamilton Mourão, vice-presidente, como chefe do Conselho da Amazônia, órgão voltado, ironicamente, para a proteção e desenvolvimento da Amazônia [7]. Os guatós, cultura de mais de dez séculos de história, são a definição mais literal de “família tradicional brasileira” e estão pela terceira vez em risco de extinção e, diferentemente das décadas de 1950 e 1960, quando não possuíam quaisquer auxílios governamentais, são alvos das políticas monstruosas de Bolsonaro e seus aliados. #PANTANAL #QUEIMADAS #GUATÓS #IDENTIDADE #BOLSONARO Mariana Ramos Graduanda em Ciências Sociais (FFLCH – USP) e bolsista do Projeto CineGRI. Referências bibliográficas [1] GUATÓS vivem no Pantanal há mil anos, revela teste. Folha de São Paulo, 1999. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq31089907.htm >. Acesso em: 3 de novembro de 2020. [2] VALENTE, Rubens. FILME narra história de índios tidos como extintos e que vivem na região do Pantanal. Folha de São Paulo, 1999. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq31089906.htm >. Acesso em: 3 de novembro de 2020. [3] PANTANAL teve 14% do bioma queimado apenas em setembro e área devastada já é recorde histórico, diz Inpe. Globo, 2020. Disponível em: < https://g1.globo.com/natureza/noticia/2020/10/07/pantanal-bate-recorde-historico-de-numero-de-queimadas-em-setembro-desde-inicio-das-medicoes-do-inpe-com-mais-de-14-mil-focos-em-um-mes.ghtml >. Acesso em: 3 de novembro de 2020. [4] GESTÃO da Funai vai para Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos. Canal Rural, 2018. Disponível em: < https://www.canalrural.com.br/noticias/gestao-da-funai-vai-para-ministerio-da-mulher-familia-e-direitos-humanos/ >. Acesso em: 3 de novembro de 2020. [5] MINISTÉRIO da Agricultura será responsável pela demarcação de terras indígenas. UOL, 2019. Disponível em: < https://migalhas.uol.com.br/quentes/293643/ministerio-da-agricultura-sera-responsavel-pela-demarcacao-de-terras-indigenas >. Acesso em: 3 de novembro de 2020. [6] BOLSONARO defende "família tradicional" e chama ideologia de gênero de "coisa do capeta". Correio do Povo, 2019. Disponível em: < https://www.correiodopovo.com.br/not%C3%ADcias/pol%C3%ADtica/bolsonaro-defende-fam%C3%ADlia-tradicional-e-chama-ideologia-de-g%C3%AAnero-de-coisa-do-capeta-1.357773 >. Acesso em: 3 de novembro de 2020. [7] "ÍNDIO tá evoluindo, cada vez mais é ser humano igual a nós", diz Bolsonaro. UOL, 2020. Disponível em: < https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2020/01/23/indio-ta-evoluindo-cada-vez-mais-e-ser-humano-igual-a-nos-diz-bolsonaro.htm >. Acesso em: 3 de novembro de 2020.
- O claro enigma do uso político da ciência
#PraCegoVer [FOTOGRAFIA]: No centro da imagem, Benedict Cumberbatch, que interpreta o personagem Alan Turing, está digitando em uma máquina. Ao seu redor, estão uma mulher e outros três homens, todos vestidos com roupas do século XX. O fundo da imagem se assemelha a um galpão. Fonte: https://acreandoporai.wordpress.com/2015/03/30/joan-clarker-e-o-jogo-da-imitacao/ De acordo com o dicionário, “enigma” significa mistério, pergunta de difícil interpretação ou aquilo que não se compreende. Entretanto, durante a Segunda Guerra Mundial, essa palavra era muito mais do que apenas um verbete no dicionário. Enigma era o nome da máquina utilizada pelos alemães para enviar mensagens militares criptografadas, aparentemente indecifráveis. A partir dessa máquina, é possível notar como a ciência pode ser instrumentalizada para fins políticos, revelando a linha tênue entre integridade e conhecimento. É justamente esse o tema de O Jogo da Imitação (Morten Tyldum, 2014). O filme mostra como o governo britânico contou com a ajuda dos melhores cientistas do mundo para desvendar a Enigma e vencer a guerra. Liderada pelo famoso Alan Turing (Benedict Cumberbatch), a equipe conseguiu criar uma máquina capaz de decodificar as mensagens alemãs, vencendo a ciência com a própria ciência. De acordo com historiadores, esse feito foi capaz de encurtar o conflito em mais de 2 anos, salvando cerca de 14 milhões de vidas. Assim, é possível perceber que “o conhecimento é em si mesmo um poder” (Francis Bacon), cabendo aos indivíduos decidir o que fazer com esse poder. Embora a Segunda Guerra tenha acabado há 75 anos, a estreita relação entre ciência e política ainda se faz sentir no presente. As chamadas Fake News são um claro exemplo disso: apresentadas ao público como verdadeiras, as notícias são utilizadas para espalhar desinformação e moldar o pensamento dos indivíduos. Repetidas milhares de vezes, o que antes era mentira passa a ser entendido como verdade, anulando o esforço de pesquisadores e estudiosos para produzir conhecimento de qualidade. Esse fenômeno se assemelha ao duplipensamento presente na obra 1984 (ORWELL, George), conceito que se caracteriza pela capacidade de dizer mentiras deliberadas e, ao mesmo tempo, acreditar sinceramente nelas. Para que a sociedade não alcance o nível de alienação ilustrado no livro de Orwell, o primeiro passo é reconhecer que o conhecimento acaba sendo – de fato – desvirtuado a favor de interesses políticos e ideológicos, influenciando tanto na vida pessoal quanto no convívio coletivo. #PraCegoVer [FOTOGRAFIA]: À esquerda, são encontradas duas máquinas grandes com fiação vermelha. À direita, Benedict Cumberbatch, que interpreta o personagem Alan Turing, olha para a câmera. Ele veste blusa social listrada, gravata de poá azul e suspensório. Na sua mão esquerda, é possível encontrar uma folha de papel. Fonte: https://veja.abril.com.br/blog/e-tudo-historia/cura-gay-e-ponto-real-e-cruel-do-filme-o-jogo-da-imitacao/ Desse modo, o questionamento que resta é como fazer a política atuar a serviço da ciência (e não o contrário). Segundo Mariana Barbosa, “Botões de curtidas e compartilhamento viraram armas, usadas para viralizar mentiras, influenciar políticas e conquistar poder” [1]. Assim como no filme O Jogo da Imitação o personagem principal entendeu que, para vencer uma máquina, era necessário outra máquina, a sociedade atual também precisa se armar com as mesmas ferramentas do adversário. É fundamental fazer a Ciência circular para além dos meios acadêmicos, promovendo um diálogo mais aberto com a sociedade em geral. A pesquisadora Natália Pasternak, posicionando-se acerca do corte de verbas para a atividade científica, declarou: “Enquanto nós não fizermos um esforço para esclarecer à população e aos representantes eleitos que Ciência é um bem essencial, talvez a gente perca essa batalha. É muito importante investir nesse momento em uma comunicação transparente e honesta com a sociedade e pedir o apoio dos representantes eleitos para que a Ciência seja financiada e mantida de forma contínua, e que seja considerada um bem tão essencial quanto saúde e educação – porque, inclusive, não existe saúde e educação sem investimento em Ciência.” [2] Em uma época tão conturbada quanto a atual, em que o mundo enfrenta a pandemia de Covid-19, a Ciência se mostra cada vez mais indissociável da vida social e política, sendo necessário ficar atento para o uso que se faz dela. Enquanto a Ciência pode descobrir a cura para o coronavírus, ela também pode ser manipulada para espalhar inverdades e preconceito. Em conclusão, deve ser mantida em mente a frase proferida por Samuel Johnson: “Integridade sem conhecimento é fraca e inútil, mas conhecimento sem integridade é perigoso e horrível”. Júlia Cristina Buzzi Graduanda em Relações Internacionais (IRI-USP) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2020/2021. #Ciência #Política #FakeNews #Conhecimento #Poder Referências bibliográficas: [1] SINGER, Peter Warren. Entrevista “Guerra de likes”: Precisamos dominar as ferramentas e fazer a verdade viralizar. Em M. Barbosa (Org.), Pós-Verdade e Fake News: Reflexões sobre a Guerra de Narrativas (p. 97-107). Rio de Janeiro: Editora de Livros Cobogó, 2019. [2] O PL 529 PREJUDICA A CIÊNCIA PAULISTA. Jornal da USP, 2020. Disponível em: https://jornal.usp.br/universidade/o-pl-529-prejudica-a-ciencia-paulista/ Acesso em: 30/09/2020
- Explicando o Coronavírus e o mito da pandemia democrática
#PraCegoVer [FOTOGRAFIA]: À direita da imagem estão dois agentes de saúde, inteiramente com roupa de proteção, carregando uma criança à esquerda, de forma pouco delicada e sem equipamentos para isso. Fonte: https://brasil.elpais.com/brasil/2015/04/21/album/1429627341_379648.html Se há coisas impossíveis de evitarmos como seres humanos, essas são a morte, os impostos e as pandemias. É assim que Maryn McKenna, jornalista especialista em saúde pública introduz o episódio “A próxima pandemia” da série Explicando, exclusiva da Netflix. O episódio, quase que como uma premonição, fala sobre o nosso futuro incerto como humanidade e como devemos lidar com as próximas pandemias, antes mesmo de saber que o ano de 2020 seria marcado pelo COVID-19. No entanto, apesar de contextualizações corretas sobre os termos biológicos, o episódio apaga uma realidade importante dentro do contexto pandêmico: há regiões que adquirem mais sequelas que outras. A série aborda os princípios básicos para compreender o nascimento dos vírus responsáveis pelas pandemias, mas esquece de relatar que há diferenças entre os sistemas de saúde e poder aquisitivo dos países afetados por elas. O ecologista de doenças Peter Daszak expõe que os vírus nascem em regiões cujas populações convivem mais com animais silvestres, praticam mais caças e são submetidas a mercados abertos, sem meios adequados de socialização da comida. Além disso, esses países também são carentes de investimento em saúde pública, falta de acesso a saneamento básico e são economicamente incapazes de acessar recursos biotecnológicos para comprar vacinas com a rapidez com a qual países economicamente desenvolvidos, como Estados Unidos da América ou a Rússia, compram. Mas afinal, que países são esses? Estamos falando, majoritariamente, dos países com menor IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), concentrados principalmente no sul global. Estima-se que, em 2019, a lista de países com menor IDH era composta por 80% de países da África, América latina e central, como Burundi, Haiti e Serra Leoa. Segundo a OMS, a lista de países mais pobres concentram 93% das doenças no mundo. Entre os fatores, está que tais países subdesenvolvidos contam com 52 milhões de pessoas sem acesso à água potável. Sabendo disso, fica mais difícil acreditar no discurso esperançoso de Bill Gates quando diz, na série, que a tecnologia tem feito avanços inimagináveis na luta contra doenças. Se tem feito, tem feito onde? E para quem? Pensando agora, no momento mais atual possível — a luta contra o vírus popularmente conhecido como Coronavírus — podemos ver as batalhas que os países subdesenvolvidos têm travado. O continente africano, por exemplo, mesmo com taxa de contágio baixa se comparado aos outros continentes, necessita de um financiamento superior a 1,2 trilhões de dólares para combater o Covid-19, como divulgou o FMI (Fundo Monetário Internacional). Outro exemplo, e desta vez não indo muito longe, está no próprio Brasil. Tomando a cidade de São Paulo como base, a realidade mostrou-nos que os bairros paulistanos mais pobres não só são centros maiores de disseminação do vírus, como também de mortes causadas por ele. Mais de 40% dos óbitos registrados ocorreram nos 20 bairros mais pobres, sobretudo pois os moradores dessas regiões não puderam ficar em casa no período de quarentena e também pela falta de leitos disponíveis por UTI (Unidade de Tratamento Intensivo) em seus bairros, explica o colunista Rodrigo Gomes, da Rede Brasil Atual. É importante repensar, então, quão unidos estamos quando acontece uma epidemia mundial. Embora o comportamento otimista apresentado na série Explicando seja visando um avanço científico, é preciso encarar uma pandemia pelo que ela é: antidemocrática. É ingenuidade pensar que as classes são atingidas de forma equivalente e que o caminho para chegar até uma cura é contíguo, quando na verdade ainda lidamos com questões sociais mais antigas e de base no nosso próprio território. É difícil, em um país como o Brasil, onde 35% das cidades sofrem com falta de saneamento básico, acreditar que para assegurarmos a saúde basta alcançarmos uma vacina para a pandemia atual. Não temos só esta pedra no nosso caminho, temos todo um monumento a demolir. Guilherme Cavalcante Graduando em Letras Português / Alemão (FFCLH-USP), autor dos artigos “Memórias Inventadas”: uma viagem às memórias compartilhadas entre a população corumbaense e o poeta Manoel de Barros” (Instituto Acaia, 2018) e “O cinema português de Manoel de Oliveira: representações do amor e o mal-estar modernista” (Mosaico-UNESP, 2020). #Covid19 #Explicando #Epidemia #Saúde #Democracia Referências bibliográficas Explicando: A próxima pandemia (Ezra Klein, Joe Posner, 2019) CYMBALUK, Fernando. No Brasil, 35% das cidades sofrem com doenças ligadas a falta de saneamento. Notícias UOL, 2018. Disponível em: . Acesso em: 07, outubro de 2020. África precisa de financiamento para lutar contra a pandemia, diz FMI. Notícias UOL, 2020. Disponível em: . Acesso em: 09, outubro de 2020. SCHWARCZ, Lilia M. Quando acaba o século XX. São Paulo, Companhia das Letras, 2020.
- Industrialização e trabalho
Para inaugurar Cinema e Geopolítica para vestibulares, o CineGRI escolheu o filme Tempos Modernos (1936), dirigido por Charlie Chaplin, um clássico da história do cinema recomendado por vários professores do ensino médio. A obra de Chaplin é uma crítica às condições de vida e de trabalho na sociedade industrial capitalista. Nele observamos a dinâmica das relações de trabalho que estavam sendo estabelecidas durante o processo de industrialização e somos levados a profundas reflexões sobre os aspectos da vida urbana e os problemas gerados pelo avanço da industrialização. Na segunda metade do século XVII, a Europa passou por uma série de mudanças que transformaram completamente a estrutura da sociedade. Esse período ficou conhecido como Revolução Industrial que, iniciada na Inglaterra, foi responsável por consolidar o sistema capitalista, pondo fim à preponderância do capital mercantil sobre o industrial. Abaixo temos um infográfico com os principais acontecimentos do processo de industrialização. Tempos Modernos retrata o processo industrial na sua fase mais avançada, conhecido como linha de produção do sistema fordista. É na figura do personagem principal “Carlitos” (Charlie Chaplin), operário de uma fábrica que fica responsável por apertar parafusos, que observamos alguns aspectos da vida dos trabalhadores. No filme, a função desempenhada por Carlitos exigia produtividade e desempenho, pois era necessário gerar lucro para os donos das fábricas. Ainda que faça uso do humor, proporcionado pelas trapalhadas do personagem principal, é interessante notar a contradição do capital e do trabalho que está presente de forma explícita na produção cinematográfica. O patrão fica numa sala armando quebra-cabeças e lendo jornal, ao mesmo tempo em que de um monitor controla todos os movimentos dos operários e dita o ritmo de produção a ser executado. No decorrer da obra, observamos uma realidade difícil para sobreviver nas grandes zonas urbanas: a promessa de emprego não garantia qualidade de vida para essas pessoas, apenas mantinha recursos básicos para que sobrevivessem. #ParaCegoVer: Cena do filme em preto e branco do trabalho fabril. Na imagem temos esteira que pertence ao maquinário da fábrica; de frente para esteira temos quatro homens; e no centro está o ator Charlie Chaplin exercendo sua função de apertar parafusos. Fonte: https://www.pinterest.pt/pin/678917712551312641/ Segundo a matéria ‘Tempos Modernos’: trabalho alienado na Revolução Industrial, o filme custou a Chaplin uma série de perseguições, juntamente com a acusação de simpatias comunistas. Além disso, o ator havia recusado naturalizar-se norte-americano argumentando ser um “cidadão do mundo”, o que agravou ainda mais sua situação. Chaplin fazia parte da “lista negra” de Hollywood durante a perseguição macarthista, foi um movimento político norte-americano personificado pelo senador republicano Joseph McCarthy- daí o seu nome- de combate ao comunismo nos anos de 1950, o que tornou a situação de trabalho do diretor nos EUA insustentável (seus filmes eram proibidos), levando-o a abandonar definitivamente os EUA em 1952. No processo de industrialização, muitos trabalhadores se rebelaram contras as máquinas e as fábricas, como em Lancaster (1969) e no Lancashire (1779). Os proprietários de empresas e o governo criaram forças especiais de repressão para garantir a sobrevivência de suas fábricas. Por fim, os principais aspectos que devemos compreender sobre a Revolução Industrial e o filme Tempos Modernos, são as condições precárias de trabalho que colocavam em risco a vida e a saúde do trabalhador. A condição da classe trabalhadora acompanha outros momentos do processo industrial no mundo, trazendo novas discussões a respeito das condições do trabalho envolvendo o avanço tecnológico. Discussões essas que ainda estão presentes na contemporaneidade e que serão tratadas em nosso próximo texto. Referências bibliográficas: [1] PRIEB. M. A. Sérgio. Tempos Modernos: trabalho alienado na Revolução Industrial. Sul21. Disponível em: https://www.sul21.com.br/noticias/2012/02/os-tempos-modernos-de-chaplin-trabalho-e-alienacao-na-revolucao-industrial/. Acesso em 01/11/2020. ARRUDA, A. de Jobson José; PILETTI, Nelson. Toda a história: História geral e história do Brasil. São Paulo: Editora Ática, 2010. BARROS, Fernando. O que foi o macarthismo?. Superinteressante. Disponível em: https://super.abril.com.br/mundo-estranho/o-que-foi-o-macarthismo/. Acesso em 03/11/2020.
- Negacionismo: o avanço da desinformação
#ParaCegoVer [FOTOGRAFIA]: No centro da imagem, há um homem caminhando de cabeça baixa, enquanto no fundo há um grafite com a frase: “Qual lado da corda você tá?”. Entre a frase, de um lado dois profissionais da saúde (um deles utiliza uma capa de super-herói) e do outro o presidente Jair Messias Bolsonaro e um “homem vírus”. Fonte: https://www.instagram.com/p/CB3vs5QnT0R/?utm_source=ig_web_button_share_ Do francês (négationnisme), o negacionismo trata-se da negação da realidade e cientificamente é definido como a rejeição de conceitos básicos incontestáveis. Esse arranjo conversa com a situação brasileira de pandemia, pois diariamente a população é bombardeada por fake news e discursos controversos partidos de autoridades. Historicamente, essa onda negacionista teve diversas marcas que vão desde holocausto até a aids. O problema dessa atitude de rejeitar o incontestável é o seu impacto na sociedade: a desinformação. No filme Negação (2017), dirigido por Mick Jackson, aborda-se uma história real em que uma historiadora (Deborah Lipstad) precisou provar na corte a existência do holocausto contra um biógrafo de Hitler (David Irving). Por mais emblemática que seja a narrativa, é de suma importância deslocar o olhar para o papel da mídia no enredo e como esses aspectos se espelham atualmente. Para isso, é possível usar como referência a cena em que, após o primeiro dia de julgamento, há um display de chão em frente à uma loja, com a seguinte frase: “sem buracos, sem holocausto”, após o veredicto o mesmo muda para “Veredito do caso Irving: ele mentiu”. A batalha judicial da historiadora Deborah Lipstadt — especialista americana no Holocausto —, cujas afirmações foram questionadas por David Irving, — um sujeito sem qualquer formação acadêmica —, mas bastante arrogante, nos ajudam a entender a cena citada anteriormente, tendo em vista a forma que por muitas vezes a mídia age dando visibilidade a informações falsas e favorecendo um lado. O problema de dar ênfase à frente que está “ganhando” é que, por vezes, esta não é sinônimo de veracidade, o que ocorre justamente com a primeira notícia. Fora das telas, esse impasse também se implica a diversas esferas da sociedade brasileira que são autênticas, como a ciência. O conhecimento baseado no método científico é a base para diversos avanços na área da saúde, alimentação e principalmente qualidade de vida. No entanto, essa narrativa que deveria estar à frente em momentos de instabilidade, como o de pandemia, fica em segundo plano dando espaço ao negacionismo que se fortaleceu com discursos e conspirações que não possuem fundamento e muito menos sustentação. As grandes massas que deveriam dar palco à estabilização, a coloca em segundo plano e consequentemente o negacionismo vai à frente, deixando a população confusa, dividida e desinformada. Além do mais, outro fato atual que contribui para a alta do negacionismo científico é que, nos últimos anos, as universidades sofreram uma série de cortes de verbas e bolsas de estudos. Esse fato contribuiu para que a sociedade duvidasse da produção científica nas instituições. Edison Bueno, médico sanitarista e chefe do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), em entrevista para o site Uol [1], declarou: "Mesmo compreendendo que devemos ter autonomia para tomar decisões, não cabe aceitar atitudes ou posicionamentos que vão contra o bem-estar ou, pior, colocam em risco a vida de todos", essa afirmação é importante porque o ceticismo generalizado parte de achismos particulares e colocam-se à frente de verdades públicas, atingindo a ciência e acarretando a desinformação. Assim, a ciência acaba sendo uma corda puxada de um lado para o outro, por dois lados diferentes, que, uma hora, acaba se arrebentando. Pâmela Vitória Graduanda em Letras (FFLCH) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2020-2021. #Negacionismo #Ciência #Desinformação #Negação #Sociedade Referências bibliográficas [1] TESTONI, Macelo. Negacionismo prejudica não só a saúde como conquistas e avanços na medicina: Disponível: https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2020/05/21/negacionismo-prejudica-nao-so-a-saude-como-conquistas-e-avancos-da-medicina.htm Acesso em: 21/05/2020, 04:00. SOUKI, Nádia. Hannah Arendt e a banalidade do mal. Belo Horizonte: Ed. UFMG,1998.